inte e quatro horas depois da tragédia que se abateu sobre a família Mutran, com a trágica morte do empresário Benedito (Bené) Mutran, que morava na cobertura do Edifício Diamond Tower, na Praça da República, Belém ainda está em choque. O que teria levado um dos empresários mais reconhecidos no agro nacional a dar cabo da própria vida é a pergunta que não quer calar.
Em respeito à família, a coluna não
fez perguntas, mas ouviu amigos e pesquisou: negócios mal resolvidos que podem
inclusive ter desencadeado uma depressão combinada com problemas de saúde.
Bené Mutran foi um ícone na pecuária
nacional e um homem à frente do seu tempo. Precursor de tecnologias avançadas
na produção genética animal, era dono de inúmeras fazendas no sul do Pará,
entre elas a “Cedro”, “Maria Bonita” e “Espírito Santo”, em Xinguara,
além da Agropecuária Santa Bárbara, em Eldorado dos Carajás, que
escreveria seu destino final pelas mãos de um homem chamado Daniel Dantas, dono
do grupo Opportunity, como se verá a seguir.
Começo de um trágico fim
Foi justamente com Daniel Dantas que
Benedito Mutran Filho engatou um negócio milionário que não saiu do papel
conforme previra. Ele vendeu suas fazendas, incluindo a Agropecuária Santa
Bárbara, por R$ 200 milhões, dos quais recebeu apenas 15%. Na região sul e
sudeste do Pará, reza a lenda que Daniel Dantas foi apenas testa de ferro de um
filho do presidente Lula, o Lulinha, que virou figura carimbada naqueles
municípios, mas não há confirmação sobre o suposto negócio.
Pelo sim, pelo não, Bené levou um
calote do tamanho da megalomania de Daniel Dantas, o homem que um dia sonhou
controlar a telefonia brasileira, mas perdeu e, na porteira aberta por Bené
Mutran, também empacou. Benedito Mutran Filho estava doente e depressivo e
havia colocado à venda a cobertura do Diamond Tower em que morava.
A coluna transcreve a seguir
reportagem publicada pela Revista Época, em 24 de junho de 2011, assinada pelo
jornalista Hudson Corrêa, envolvendo a crise em que Daniel Dantas enveredou no
Pará levando de roldão a paz e o conforto do empresário Benedito Mutran Filho:
O calote de Daniel Dantas
Em 2008, o financista Daniel Dantas
saiu da Brasil Telecom após uma guerra judicial que incluiu espionagens e jogo
de influências. Ao fim da briga contra fundos de pensão e empresas
estrangeiras, aceitou vender suas ações na companhia e recebeu aproximadamente
US$ 1 bilhão na transação. Apesar da quantia embolsada, o desfecho daquela que
foi considerada a maior disputa societária do País soou como derrota para o
homem que um dia sonhou em ser o grande controlador da telefonia no Brasil.
Dominar o sistema nacional de
telecomunicação não foi a única meta megalomaníaca de Dantas. Em 2005, o grupo
empresarial do financista, o Opportunity, montou a Agropecuária Santa Bárbara
Xinguara, criada para ser a maior produtora de gado do mundo. Comprou 27
fazendas e formou um rebanho de 500 mil cabeças. Documentos obtidos por “Época”
revelam que Dantas, como produtor rural, também começa a acumular problemas. A
Santa Bárbara tem dívidas de R$ 60 milhões com fazendeiros dos quais comprou
terras e bois. E está inadimplente.
Os documentos que descrevem as
dívidas são relatórios de diretoria da Santa Bárbara produzidos entre o fim de
2010 e o começo deste ano. Nesses papéis, a companhia informa que a
inadimplência é consequência do sequestro das fazendas e do gado pela Justiça
Federal.
A decisão judicial foi tomada em
julho de 2009 num dos desdobramentos da Operação Satiagraha, da Polícia
Federal. Na investigação, a PF acusou Dantas de lavar dinheiro ilícito
comprando fazendas e gado no Pará. Ele nega qualquer ilegalidade.
Sem conseguir vender parte do rebanho
e com pedidos de empréstimos constantemente rejeitados por bancos, por causa do
bloqueio de bens, a Santa Bárbara afirma nos relatórios que as dívidas tendem a
aumentar. Procurada, a agropecuária não negou a inadimplência. Sem citar
valores, disse apenas que “a renda gerada pela Santa Bárbara ficou aquém do
valor necessário para pagar as terras adquiridas”.
No mesmo relatório em que reconhece
as dívidas, a empresa apresenta uma saída a seus credores. Eles foram autorizados
a negociar no mercado os créditos - as dívidas vencidas - que possuem contra a
Santa Bárbara. Eles podem tentar receber de investidores, que pagariam a conta
agora com o objetivo de receber uma quantia bem maior da Santa Bárbara. A
dúvida é saber quem pode se interessar por papéis de uma empresa com bens
sequestrados e acusada de lavagem de dinheiro.
O negócio só parece viável se o
crédito for comprado a preço de banana. “Imagina o deságio”, diz o empresário
paraense Benedito Mutran Filho, de 68 anos, que tem R$ 65 milhões para receber
do empreendimento de Dantas.
|