uem entra ou sai de Belém pela BR-316, trecho Entroncamento-Ananindeua, conhece bem os dissabores que é trafegar pela rodovia, graças às intermináveis obras de construção do BRT Metropolitano. Com o início do mês de novembro, inevitável é lembrar que faltam dois meses para o fim do último prazo divulgado pelo governo do Pará para a conclusão da obra, prevista para o final deste ano.
De acordo com o Portal da
Transparência, até outubro de 2023 já haviam sido gastos R$ 423,7 milhões
com o BRT Metropolitano, valor correspondente a 88,6% do orçamento previsto,
atualmente de R$ 478,1 milhões, segundo um levantamento da Agência
Cenarium.
História do sem fim
Já se vão três anos para a
conclusão da obra. Única via de entrada e saída de Belém, desde
2019, quem precisa utilizar a BR parece cumprir uma dolorosa penitência. A
situação piora quando chuvas intensas e maré alta, aliadas, fazem
transbordar o Igarapé do Toro (vídeo abaixo) - ou Igarapé do
Aurá para os locais -, que corta a rodovia, causando alagamentos e
grandes congestionamentos, em cenas que se repetem continuamente.
O projeto BRT
Metropolitano, iniciado em 2019, tinha prazo de conclusão de 19 meses,
ou um ano e sete meses. A contar do início da obra, a população já
deveria estar usufruindo das instalações desde agosto de 2020.
Entretanto, ao final de outubro de 2024, as pistas do BRT
seguem em obras.
Centenas de blocos de concreto,
máquinas, homens e equipamentos; escavações, desvios que nascem do dia para a
noite sem iluminação, acidentes, trombadas de veículos pesados destruindo
estruturas já erguidas, pavimentação inacabada e nem metade das 13 passarelas
previstas instaladas até agora. O trânsito é caótico, chova ou faça sol.
O projeto do BRT
Metropolitano integra um sistema chamado Nova BR, que inclui a
implantação de integração do BRT que deverá ligar os municípios de Belém,
Ananindeua, Marituba e Benevides, com orçamento, em 2023, de R$ 478
milhões. As obras são coordenadas pelo Núcleo de
Gerenciamento de Transporte Metropolitano (NGTM), do governo do
Pará.
Em 7 de dezembro de 2018, o então governador do Pará, Simão Jatene, a Agência de Cooperação Internacional (Jica) e a Embaixada do Japão no Brasil assinaram a ordem de serviço das obras, com início previsto para a segunda-feira seguinte, dia 10. Nesse dia, se bem observaram, os japoneses aprenderam que o Brasil não é para amadores. A obra não andou.
Os olhos da cara
O arrojado projeto previa uma grande
reforma estrutural para a entrada da capital paraense, desde a rede de drenagem
até os chamados retoques finos, como paisagismo e moderna rede de iluminação
pública em LED, em 10,8 km de extensão. Na ponta do lápis, cada mil metros,
ou cada quilômetro do BRT Metropolitano custou, até o momento, R$
43.454,54.
As obras de reconstrução e
requalificação previam pistas com três faixas de rolagem nos dois
sentidos, pavimento flexível, uma faixa em cada sentido exclusiva
para o BRT Metropolitano, duas ciclovias bidirecionais, gramado próximo à
ciclovia para arborização, dois passeios para circulação de pedestres com 2,5m
de largura, faixa de piso tátil e rampas de acessibilidade, além de mobiliário
urbano, com bancos, lixeiras e abrigos em paradas de ônibus
convencionais.
O governador de então, no dia da
assinatura da ordem de serviço, destacou que acompanhava o início das
discussões desse projeto de mobilidade urbana desde a década de 1980,
quando ainda era técnico do governo do Estado. Ele ressaltou o papel
da parceria com o governo japonês, que defendeu esta intervenção com
garra e persistência. A obra começou com orçamento em dia e toda
planejada, mas houve várias alterações no projeto inicial
A visagem das águas
Sobre a questão dos recorrentes
alagamentos, a resposta é que seriam construídos dispositivos de drenagem para
coleta e condução dos efluentes, como sarjetas, bocas de lobo, caixas de
inspeção e passagem, e tubulação de drenagem profunda, com diâmetros entre 800
mm e 1.500 mm, para lançamentos do sistema de drenagem nas vias secundárias
adjacentes à rodovia. Não combinaram isso com o Igarapé do Aurá, um morto
que ressurge despertado pelas grandes chuvas e as marés para fazer visagem para
toda a Grande Belém.
O projeto também previa a construção
de quatro túneis de acesso subterrâneo aos terminais e ao viaduto de
Ananindeua, que permitiria a ligação direta entre as áreas ao sul da BR, como
conjunto Júlia Seffer e Aurá, à Cidade Nova. Para a construção desse sistema
complementar, os recursos eram da ordem de R$ 80 milhões,
equivalente a 15% do total licitado, também contemplados pelo financiamento
da agência japonesa.
Um dia, talvez, quem sabe...
Ainda segundo o planejamento de seis
anos atrás, o novo sistema de transporte
urbano pretendia reduzir em cerca de 50% o tempo de viagem do destino
ao Centro de Belém e vice-versa. O ponto inicial do BRT é o Terminal
Marituba, localizado no Km 10,7 da rodovia, próximo à Alça Viária, com integração
das linhas alimentadoras que vêm de Marituba.
Em Ananindeua, o projeto previa
que o terminal seria no Km 6,5 da rodovia, em frente à sede
campestre da Associação Atlética Banco do Brasil. Nesses terminais
seriam ofertados serviços à população, como acesso gratuito à internet sem
fio e a Estação Cidadania.
“Cenários externos”
Questionada sobre o porquê de tantos
atrasos, a direção do NGTM alega que, ano passado, “cenários externos à
administração estadual são motivos de tanto atraso, como a crise sanitária
da covid 19, mudança de empresa responsável pela obra e metodologia
de execução do projeto”.
A obra começou sob a responsabilidade
da empresa Odebrecht Engenharia e Construção, que montou acampamento em Belém
com a recomendação: de “capacidade técnica reconhecida nacional e
internacionalmente em importantes obras de infraestrutura no Brasil e
no mundo”.
Rasgando as folhinhas
Entre 2020 e
2021, a Odebrecht recebeu cerca de R$ 153 milhões do governo do Pará, e
largou a obra por discordar do governo nos “aspectos da execução do
projeto”. No lugar da Odebrecht, assumiu o Consórcio Mobilidade Grande
Belém - o segundo colocado na licitação -, que iniciou os serviços em outubro
de 2021, quando recebeu R$ 47 milhões.
Em 2022, o consórcio
recebeu mais R$ 84 milhões. De janeiro a 30 de
setembro de 2023, o Estado fez o maior repasse financeiro desde o
início das obras: R$ 141 milhões. O prazo de conclusão estava previsto
para agosto de 2020, mas veio a pandemia. Depois, ficou para o primeiro
semestre de 2023 e, atualmente, o novo prazo foi definido para o final deste
ano - o que não vai, com o perdão do trocadilho, se concretizar.
Em visita às obras do BRT, em 9
de fevereiro de 2022, o governador Helder Barbalho prometeu entregar a obra no
primeiro semestre de 2023, o que também não ocorreu. O novo prazo vence em dois
meses. E também não vai ser cumprido.
A areia e o caminhão
A rede social é pródiga em
comentários sobre o BRT, um monstro devorador de dinheiro, de tempo e de
paciência que já nasceu obsoleto e nem acabou: “Está devagar, quase parando”.
Outro: “Passei hoje cedo por lá e contei nos dedos: tinha uns 15 trabalhadores,
dois trabalhando de verdade e os outros no celular, tomando café e batendo
papo”. E outro: “Isso vai se arrastar por anos, é um sofrimento sem
fim”. E por fim: “O pior é o governo falar que essa obra gera
empregos, mas, se forem ver, os trabalhadores são todos do Nordeste”.
Exageros?
Papo Reto
· Vereadora Sílvia Letícia (foto) quer
saber da Prefeitura de Belém e da empresa Ciclus quais são as medidas para
conter enchentes durante o inverno. A Ciclus é responsável pela coleta de
resíduos sólidos na cidade.
· A parlamentar do Psol também
quer uma cópia da multa de R$ 500 mil aplicada à empresa pela prefeitura e
informações sobre quando será realizado o referido pagamento, que, segundo ela,
deverá ser aplicado pelo Executivo para equipar com maquinários as cooperativas
de catadores de resíduos sólidos.
· A multa aplicada pela
prefeitura à empresa ocorreu devido à coleta irregular de lixo na cidade no
final de semana de 26 e 27 de outubro.
· Quem foi homenagear entes
queridos no Parque da Eternidade, em Marituba, no Dia de Finados, estranhou o
ar de abandono que, lamentavelmente, tomou conta daquele cemitério.
· Em Icoaraci, nos cemitérios
Santa Izabel e do Tapanã a coisa foi mais complicada: os visitantes precisaram
se virar nos trinta para abrir trilhas e poder chegar às sepulturas dos entes
queridos.
· Sem falar no fogaréu que
consumia as matas circundantes e até dentro do cemitério, no caso do Tapanã,
onde o serviço público só dá as caras uma vez por ano.
· Ontem, mais de 4 mil pessoas se
submeteram às provas do Enem em 1.753 municípios brasileiros, com passe livre
em 17 capitais, mas não em Belém, que diz ter ampliado o número de linhas e
horário de funcionamento dos ônibus.
· Em São Paulo, as escolas
públicas terão carga extra de português, matemática e educação financeira na
grade escolar-2025.