Obras de adaptação do Porto de Outeiro não aparecem e elevam risco de fracasso diplomático

Sem transparência e com ações opacas entre os governos, estratégia para atracação de navios de cruzeiros é preocupante.

Por Olavo Dutra | Colaboradores

11/05/2025, 11:00

Imagens exclusivas não indicam movimentação de trabalhadores, máquinas ou equipamentos em obra no Porto em Outeiro/Fotos: Divulgação-Coluna Olavo Dutra.


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elém e Brasília - De todas as obras financiadas com recursos federais e estaduais no pacote de preparativos para a COP30, prevista para novembro deste ano, em Belém, a mais preocupante - porque não se vê - envolve a adequação do Porto de Outeiro, antigo Porto da Sotave, para receber navios de cruzeiro com participantes do evento da ONU. 

Desde que o governo do Estado optou por cancelar a dragagem do Porto de Belém, pela inviabilidade da operação, tempo e custos, as instalações de Outeiro passaram a ser restritas, exceto, ao que se sabe, para o único operador do porto, a empresa Navegação Matapi. Longe dos olhos da população e até dos operadores de turismo e do segmento portuário, a obra é tida e havida como “inexistente”, por mais improvável que seja. 

De fato, imagens inéditas obtidas pela Coluna Olavo Dutra não permitem identificar o que poderia ser um trabalho de reforma ou adaptação do porto, nem mesmo qualquer operação em curso, o que favorece os ruídos de paralisia. Para tornar o quadro mais nebuloso, as autoridades ligadas à obra preferem não se manifestar - caso da CDP, por exemplo, ou dos próprios organizadores locais da COP30. 

Faltando pouco mais de seis meses para a COP30, Belém vive um paradoxo logístico. Considerado um dos principais projetos de ampliação da oferta de hospedagem, a reforma do porto é uma incógnita. Com orçamento estimado em mais de R$ 200 milhões, o porto segue cercado de silêncio. Nunca antes na história da obra se viu uma empreitada tão silenciosa.

A falta de transparência se estende ao fato de que há zero acesso à imprensa e, mais grave ainda, sem que o próprio secretário nacional da COP, Valter Correia, tenha conseguido visitar o local na sua última estada em Belém.

O que seria um “plano B” após o abandono do projeto de dragagem do Porto de Belém parece ter se transformado em um enigma embaraçoso para os organizadores. O silêncio CDP, a ausência de respostas do governo do Pará e as recusas sistemáticas à presença de membros do governo federal levantam suspeitas de que a obra ainda não saiu do papel.

A justificativa técnica apresentada inicialmente para adaptar o Porto de Outeiro previa a construção de um flutuante de aço com mais de 100 estacas - estruturas que não existem no mercado local - para permitir o atracamento de dois transatlânticos. Mas o projeto parece ter esbarrado não só na engenharia, mas em algo ainda mais concreto: a recusa de empresas em assumir o risco técnico e financeiro da obra. 

Fontes do setor portuário a classificam como “tecnicamente inviável” para cruzeiros de grande porte.

Censura velada

Durante recente visita a Belém, Valter Correia foi, ainda que de forma velada, impedido de inspecionar as obras no porto, sob alegações não esclarecidas. A ausência da vice-governadora Hana Ghassan nos eventos federais ligados à COP também chamou a atenção. Apesar de tentativas insistentes de Correia, Hana, que é coordenadora do Comitê da COP 30 no Pará, se fez representar de forma protocolar, com direito a silêncio absoluto.

No lugar de uma resposta institucional articulada, o governo estadual optou por promover sua própria coletiva de imprensa - cuidadosamente montada para projetar protagonismo isolado do Estado. A presença de Correia foi, segundo fontes, improvisada, e a apresentação da vice-governadora focou em dados genéricos, ao passo que o secretário federal trouxe à tona informações mais objetivas: o governo federal de fato pretende investir nos navios. Serão R$ 30 milhões, por meio da Embratur, para garantir a contratação de navios de cruzeiro, com apoio logístico e hospedagem para seis mil pessoas.

 Navios sem porto

A contradição central de toda a operação é gritante: há uma estratégia federal definida, com valores empenhados e operadoras marítimas confirmadas - MSC e Costa Cruzeiros -, mas não há garantia de que o porto prometido tenha condições reais de receber as embarcações. A “Garantia de Solução de Hospitalidade”, firmada pela Embratur, envolve ainda mais R$ 233 milhões a serem recuperados via venda de cabines - uma operação de alto risco se o atracadouro não estiver pronto.

O resultado é um cenário preocupante de descompasso institucional, ausência de transparência e potencial vexame internacional. Se os cruzeiros não puderem atracar por falta de estrutura, o Brasil compromete sua imagem como anfitrião de um dos maiores eventos climáticos do planeta.

Em risco simbólico

A omissão sobre o Porto da Sotave simboliza mais do que um atraso em obra pública. Sugere falta de planejamento integrado e comunicação entre os entes envolvidos. E coloca em xeque a própria credibilidade do evento como vitrine da sustentabilidade na Amazônia.

A falta de transparência não é apenas um problema de gestão - é um risco diplomático. A ONU, delegações internacionais e veículos de imprensa globais estarão atentos ao que Belém conseguirá - ou não - entregar. Se o Porto de Outeiro continuar “invisível” e inacessível, restará à organização improvisar - ou admitir o fracasso de uma promessa inflada por discursos, mas naufragada na prática.

Antigo e inapropriado

O Terminal Portuário de Outeiro, antigo porto da Sotave, localiza-se na Ponta do Redentor, na ilha fluvial de Caratateua, ou Outeiro, Distrito de Belém, no estuário do rio Guajará-açú, à margem direita da Baía do Guajará e a cerca de 19 km do Porto de Belém.

O terminal começou a ser construído, no início da década de 1980, pela empresa de adubos químicos Sotave - Amazônia Química e Mineral S.A, para funcionar como porto de importação e exportação de granéis sólidos e atender à movimentação de fertilizantes que seriam produzidos em instalações da própria empresa, o que não aconteceu. O porto acabou sendo então desapropriado em 1988 pela extinta Portobrás.

Primeiro abandono

Antes de ser concluído, o terminal teve as obras paralisadas por quase 20 anos, que foram retomadas somente em 2002, pela CDP, atual gestora do terminal, sendo então inaugurado e alfandegado em julho de 2004.

Segundo informações, o projeto de ampliação do píer do Porto de Outeiro contratada pela CDP para receber navios transatlânticos de 200 metros de comprimento está sendo feito pelo professor Pedro Afonso de Oliveira Almeida - o mesmo que fez o projeto da reconstrução da Ponte União, em Mojú, entre 2019 e 2020.

Hóspedes ilustres

A hospedagem nos navios não seria para simples mortais. Seria para delegações internacionais, representantes de países em desenvolvimento e equipes do secretariado da ONU para os quais parte dos leitos será reservada, conforme compromisso assumido pelo Brasil.

O contrato da Embratur prevê ainda a reserva de 500 acomodações para países em desenvolvimento e uma reserva técnica que poderá ser financiada pelo Fundo Fiduciário da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, ou diretamente pelos países interessados.

Desafios para gigantes

Em janeiro deste ano, uma equipe da Secretaria das Nações Unidas para a Mudança do Clima fez visita oficial em missão de cinco dias em Belém. À época, a secretária-executiva adjunta da entidade, Noura Hamladji, que coordenou a missão, disse que houve muitos avanços desde a primeira visita da ONU. Noura destacou ainda que a preparação da COP é um desafio para qualquer país - e Belém está sendo a prova dessa máxima.

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