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Antes de sair

Barroso vota pela descriminalização do aborto até 12ª semana de gestação

Apenas o magistrado e Rosa Weber já registraram posição; Gilmar Mendes suspendeu julgamento

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  • 19/10/2025, 12:00
Barroso vota pela descriminalização do aborto até 12ª semana de gestação

Brasília, DF - O ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), votou pela descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação como um de seus últimos atos na corte antes da aposentadoria.


"As mulheres são seres livres e iguais, dotadas de autonomia, com autodeterminação para fazerem suas escolhas existenciais", disse Barroso em seu voto.


Imediatamente após o voto do colega, o ministro Gilmar Mendes pediu destaque na ação. Isso interrompe o julgamento virtual e joga o caso para o plenário físico do STF, sem data para recomeço da análise.


Barroso deixou indefinido até os últimos momentos se votaria na ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 442, que retira a punição pela interrupção voluntária da gravidez.


Nesta sexta-feira (17), Barroso pediu ao presidente da corte, Edson Fachin, uma sessão virtual extraordinária para que possa deixar seu voto registrado antes de deixar o tribunal neste sábado (18).


Após cinco horas de espera que causaram nervosismo no campo favorável à descriminalização, Fachin abriu a sessão no plenário virtual, permitindo que o colega votasse.


"Em suma: têm o direito fundamental à sua liberdade sexual e reprodutiva. Direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas. Ninguém duvide: se os homens engravidassem, aborto já não seria tratado como crime há muito tempo", continuou Barroso no voto.


Pouco antes de deixar a presidência da corte, quando já havia especulações em torno da possibilidade de que ele votasse, o ministro dizia que não teria mais tempo para fazer a leitura de seu voto em plenário físico. A expectativa era de que a manifestação seria longa. O voto registrado, no entanto, tem duas páginas.


Em outras duas ações que versam sobre aborto, as ADPFs 989 e 1.207, herdadas de Fachin quando este assumiu a presidência da corte, Barroso deu votos mais longos. Nesses processos, o ministro dedicou mais fôlego: as decisões passam de 30 páginas.


Em decisões liminares, autorizou enfermeiros e técnicos de enfermagem a auxiliares aborto nos casos permitidos por lei. Ele também suspendeu procedimentos administrativos e penais por aborto contra essas categorias - apenas médicos eram citados no artigo do Código Penal que trata das exceções ao crime.


No voto da ADPF 442, ele defendeu que divergências em temas morais são comuns em democracias, mas que o papel do Estado é garantir que cada um possa estabelecer os parâmetros para a própria vida.


"Numa sociedade aberta e democrática, alicerçada sobre a ideia de liberdade individual, não é incomum que ocorram desacordos morais razoáveis. Vale dizer: pessoas esclarecidas e bem-intencionadas têm posições diametralmente opostas. Nesses casos, o papel do Estado não é o de escolher um lado e excluir o outro, mas assegurar que cada um possa viver a sua própria convicção.”


De acordo com ele, ainda, a tradição judaico-cristã condena e é legítimo ser contrário à interrupção. Ainda assim, é possível conciliar os preceitos religiosos ao direito ao aborto.


"Mas será que a regra de ouro, subjacente a ambas as tradições - tratar o próximo como desejaria ser tratado -, é mais bem cumprida atirando ao cárcere a mulher que passe por esse drama? Pessoalmente, entendo que não. Portanto, sem renunciar a qualquer convicção, é perfeitamente possível ser simultaneamente contra o aborto e contra a criminalização", disse.


Com a posição de Barroso, a ação fica com dois votos pela descriminalização. No momento não há votos contrários, pois apenas a agora ministra aposentada Rosa Weber também votou. Assim como Barroso, ela o fez como último ato antes de se aposentar do tribunal, em setembro de 2023.


Caso Barroso não votasse, o direito à manifestação passaria para o ministro que ocupar sua vaga - hoje, o mais cotado é o advogado-geral da União, Jorge Messias. O ministro comunicou nesta sexta-feira pela manhã a alguns ministros que faria esse movimento, deixando colegas do STF espantados.


A posição do ex-presidente da corte sobre o tema é conhecida, e havia expectativa entre movimentos favoráveis à descriminalização do aborto de que ele avançasse com a ação, iniciada em 2017. No entanto, o ministro não pautou a ADPF enquanto comandou o tribunal, de 2023 até o fim de setembro deste ano.


Por isso, internamente causou surpresa a decisão de Barroso. O pedido de destaque feito por Gilmar Mendes havia sido combinado previamente com o ministro, como o próprio Barroso havia feito em 2023 com a então presidente do STF, Rosa Weber.


No fim da gestão de Rosa, ela votou pela descriminalização, usando como argumentos os direitos reprodutivos e a autonomia das mulheres. A ministra se aposentou em seguida. Pouco depois da inclusão do voto no plenário virtual, Barroso pediu destaque, o que levaria o tema à discussão em plenário presencial.


Nos bastidores, fala-se que os dois combinaram o movimento para que a então relatora pudesse registrar o voto dela no tema, já que tinha conduzido a tramitação até então, chamado audiência pública e escrito sua manifestação.


Nesta sexta, Barroso pediu o cancelamento desse destaque, o que recolocou o julgamento no plenário virtual.


Barroso chegou a atuar como advogado na ação do STF que descriminalizou o procedimento em casos de anencefalia fetal, em 2012, antes de se tornar ministro da corte.


Apesar disso, o ministro repetiu ao longo de sua gestão que o país não estaria pronto para deliberar sobre o aborto e que só poderia colocar em pauta a ação quando houvesse amplo apoio popular.


Nos bastidores, diz-se que Barroso teria estimado o voto dos colegas e achava que a ação terminaria com derrota para o movimento pela descriminalização. Havia ainda um temor do ministro de acirrar os ânimos políticos, já exaltados, ainda mais.


Também por isso, a decisão definitiva para votar teria sido tomada apenas na noite de quinta (16), véspera da saída dele da corte.


Em 2016, quando a Primeira Turma da corte entendeu que o aborto não é crime se feito até o terceiro mês de gestação, a decisão foi tomada com os votos de Barroso, Fachin e Rosa. A decisão foi tomada em um caso concreto, sem repercussão geral. Mas animou setores feministas para articularem a construção da ADPF 442, apresentada em 8 de março de 2017.


Barroso anunciou no dia 9 de outubro sua aposentadoria antecipada do tribunal. O ministro ocupou o cargo por 12 anos e 3 meses e só teria que se aposentar compulsoriamente em 2033, quando completará 75 anos em 2033. Ele anunciou que deixaria a corte ao fim de uma sessão plenária.


"Sinto que agora é hora de seguir outros rumos. Nem sequer os tenho bem definidos, mas não tenho qualquer apego ao poder e gostaria de viver um pouco mais da vida que me resta sem a exposição pública, as obrigações e exigências do cargo", disse, emocionado.

Desde então, grupos e movimentos feministas têm se mobilizado para que o ministro deixasse sua posição na ADPF 442.


Quando anunciou a saída do tribunal, ele disse que a criminalização é um componente discriminatório porque "tem efeito perverso sobre as mulheres pobres".


"A consideração que eu estou fazendo é que nós já vivemos um momento com muitos temas delicados acontecendo ao mesmo tempo e os riscos de uma decisão divisiva criar um ambiente ainda mais turbulento no país", disse.


Foto: Divulgação/STF

(Com a Folha)

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Olavo Dutra

Jornalista, natural de Belterra, oeste do Pará, com 48 anos de profissão e passagens pelos jornais A Província do Pará, Diário do Pará e O Liberal.