Quando nem tudo é o que parece ser: "Folha" desnuda obras e mostra Belém para a COP30

Apesar de todos os esforços e muito dinheiro investido, preparativos para evento mundial da ONU, hoje, deixam a desejar aos olhos da equipe que veio de São Paulo.

04/06/2025, 08:00
Quando nem tudo é o que parece ser:
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ma das certezas que se tinha à época em que a COP30 foi anunciada para Belém, era que a tal grande mídia voltaria seus holofotes para a capital paraense, para o bem e para o mal. Nessa queda de braço, a parte dos problemas de Belém é o que mais se sobressai no noticiário nacional, uma vez que a mídia local, mesmo estando nos cenários, torce o nariz da conveniência sobre o que acontece.

Presidente do Instituto Trata Brasil, Luana Pretto explica que saneamento básico inclui acesso à água tratada, coleta e tratamento de esgoto, coleta do lixo e sua destinação adequada/Fotos: Divulgação.
Na segunda-feira, 2, o jornal “Folha de S. Paulo”, que está com uma equipe de cobertura jornalística em Belém há mais de dois meses, com patrocínio de peso da Ambipar e JBS e apoio do Instituto Liberta e da mineradora Vale, trouxe uma reportagem que mostra que as obras de coleta de esgoto alcançam apenas 3% da população de Belém.  

Obras e valores

Ao mesmo tempo, depois de ouvir o governo do Pará, quem, sensatamente, respondeu às demandas da “Folha” - o que não faz com os veículos locais -, anunciou que os projetos de saneamento beneficiarão 500 mil pessoas, mas informa que o esgotamento foi ampliado para apenas 40 mil e que as obras serão em etapas. O investimento nos canais soma R$ 1 bilhão do BNDES e Itaipu Binacional.

Belém está entre as piores cidades do País em coleta e tratamento de esgoto. O governo do Pará afirma em seus anúncios que as pessoas serão beneficiadas por obras de saneamento, especialmente na periferia - o que não quer dizer que se refere à coleta de esgoto, quando o número cai para 40 mil pessoas, o equivalente a 3% da população.

Ausência do básico

Os moradores de áreas mais pobres reclamam da ausência do básico em Belém. A presidente do Instituto Trata Brasil, Luana Pretto, explica que saneamento básico inclui acesso à água tratada, coleta e tratamento de esgoto, coleta do lixo e sua destinação adequada e o manejo da água da chuva, dividido em macrodrenagem, que atua no fluxo dos cursos d'água, e a microdrenagem, que abarca as tubulações. 

Ao número de mais de 500 mil pessoas beneficiadas, o governo do Pará contabiliza obras de desvio pluvial e urbanização das ruas no entorno, incluindo paisagismo, quadras de esporte, praças, playground e academia ao ar livre em 13 canais das bacias dos rios Tucunduba, Murutucu, Una e Tamandaré.

Essas obras se referem a grandes intervenções para combater enchentes e organizar o trânsito, o que não é coisa pequena, porque Belém se urbanizou aterrando trechos de várzeas e igarapés, e a população sofre com alagamentos recorrentes.  

Ligações à rede

O próprio governo informou que, especificamente no caso da coleta de esgoto, são cerca de 10 mil ligações à rede, bancadas pela gestão atual. Para especialistas, é uma contribuição muito pequena.

A atual gestão de Helder Barbalho, há dois meses, tratou de passar em frente a questão da coleta de esgoto, quando foi feita, em leilão, a concessão parcial dos serviços da Companhia de Saneamento do Pará, a Cosanpa, que delegou a coleta e tratamento de esgoto à iniciativa privada, em concorrência vencida pela Aegea. O abastecimento de água tratada na Região Metropolitana de Belém continua sendo feito pela Cosanpa.  

As metas da concessão à Aegea preveem que a parcela da população atendida por esgoto deva ir dos atuais 15,32% para 90% até 2033. Será preciso incorporar 1 milhão de pessoas à rede de coleta e tratamento de esgoto, em um esforço anual que representa o triplo alcançado pela COP 30.  

O secretário de Infraestrutura e Logística do Pará, Adler Silveira, afirma que as obras de saneamento serão feitas em etapas. Para a COP30, como primeira fase, a atuação é para desafogar os canais maiores, uma vez que estão interligados com os menores, e afirma que a seleção dos locais exige critérios técnicos. 

Os canais de Belém

Em Belém, os canais da Timbó - entregue em janeiro deste ano - e da Gentil Bittencourt são parte das obras de saneamento para a COP30. Outros canais em reforma incluem o da rua Cipriano Santos - entregue em maio passado -, parte da macrodrenagem da Bacia do Tucunduba, que beneficia a Terra Firme, Guamá, Canudos e Marco. Além disso, há intervenções nos canais Caraparu, Vileta, União, Timbó e Leal Martins, e todos eles são financiados pelo BNDES. 

O canal de São Joaquim é a única iniciativa da Prefeitura de Belém, com financiamento da Itaipu Binacional. E o que se vê atualmente é um ajuntamento de barracos, que misturam alvenaria e madeira e foram erguidos sobre uma água lamacenta. Mas o canal do Mata Fome foi deixado de lado, talvez por ficar localizado no Distrito de Icoaraci, longe dos olhos da COP. Na verdade, o “legado” da COP 30 aos moradores do entorno do canal é a terra retirada de outras obras. Segundo os moradores, as pilhas são vendidas ou doadas como material para aterro.  

“O Mata Fome é uma prioridade sempre esquecida, mas uma obra lá seria o legítimo legado”, diz Amanda Quaresma, consultora ambiental que integra o Comitê Gestor do Sistema Estadual sobre Mudanças Climáticas.  

A população agradece

Com a entrega dos canais, vêm junto com o asfalto lisinho, as passarelas de metal com tinta nova e as calçadas homologadas, que deixam os moradores aliviados, felizes e comemorativos.  

Especialistas locais não discordam. “Os maiores projetos da COP30 são reformas de canais degradadas por falta de manutenção, que beneficiam muito mais áreas que já contam com infraestrutura”, afirma o arquiteto e urbanista Juliano Pamplona Ximenes Pontes, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFPA. 

Ximenes lembra que um dos poucos projetos que incluem tratamento do esgoto é o do canal da Nova Doca. "Ali, já tem infraestrutura, e no entorno, estão bairros como Umarizal - o metro quadrado mais caro de Belém, e não está longe do novo Porto Futuro, onde vão ficar os hotéis para receber visitantes da COP”.  

O local escolhido para selecionar parte do tratamento do esgoto da Nova Doca causou controvérsia. O prédio da elevatória - tipo de atividade que separa fezes e urina - fica colado à Vila da Barca. “É isso que sobrou para nós nessa COP 30: querem que a gente fique com o cocô dos ricos”, diz Inês Medeiros, professora e líder comunitária. O governo do Pará afirma, porém, que as famílias da Vila da Barca não serão prejudicadas. 

A diretora socioambiental do BNDES, Tereza Campello, reforça que os canais financiados pelo banco em Belém representam um dos maiores investimentos em infraestrutura da história e vão mudar a realidade dos moradores dessas áreas. Nos demais canais em reforma, Caraparu e canais Vileta, União, Timbó e Leal Martins, as obras seguem em ritmo acelerado. 

Parte da Nova Doca já foi aberta, e os operários fazem os acabamentos. No canal da avenida Tamandaré, que também vai virar parque linear, ainda há tapumes e não é possível avaliar o andamento da rua.  As obras dos canais do Bengui e Marambaia estão bem atrasadas. O governo do Pará diz que os trabalhos foram prejudicados pelas chuvas e estão ganhando ritmo para a entrega até o evento.  

O trecho dos canais Mártir e Murutucu, na Estrada da Ceasa, também é lento. As obras no Mártir, na parte urbana, sofreram contratempos, quando uma casa quase afundou pela ação das máquinas no local. 

Nas redes sociais

“O Governo do Estado está gastando mais de R$ 300 milhões só em uma varanda num canal de esgoto. Vão reformar o Hangar, que não precisa de reforma. O que o governo realmente está criando é o Parque da Cidade, que vai sediar o evento e fica em um bairro nobre. A ‘COP da Floresta’ vai ficar só no nome mesmo”.  

“Não há saneamento básico no centro de Belém. Moro há 20 metros da Basílica de Nazaré, e só arrumam a parte da igreja; o resto não tem saneamento algum. Todos os canais a céu aberto, moradias precárias em cima do canal e na lateral, ônibus sucateados, bandidagem à solta”.

“Sou morador do bairro do Mangueirão. Tem um canal perto daqui de casa e a única coisa que eu vi foi um monte de trator e lama, não sei se está melhorando algo”. 

Papo Reto

·O ex-deputado Miro Sanova (foto), do PT, atual presidente da Rede Cultura de Comunicação, parece que, enfim, encontrou uma causa para chamar de “sua”: a defesa dos pets.

·Não faz muito tempo, Sanova desandou a apoiar a causa animal, elogiando nas redes sociais, por exemplo, a atitude da atriz Paolla Oliveira, que adotou onze gatos e três cachorros.

·No último domingo, 1, na Praça da República, Miro Sanova colocou na rua o projeto “Bicho é Cultura”, da Funtelpa, que celebrou o bem-estar animal com uma programação de afeto e cuidados.

·Mas, e tem sempre mais um, quem trabalha na Funtelpa diz que esse cuidado é só “capa” do presidente, porque tem uma gata que circula pelas dependências da Fundação que deu cria, mas Sanova já falou para “darem um jeito” nela e nos bebês. Parece golpe animal; e é. 

·A Assembleia Legislativa deve ter votado ontem projeto do deputado Rogério Barra, do PL, que prevê a obrigatoriedade de envio de mensagem ao proprietário de veículos apreendidos por estacionamento irregular. Faz sentido.

·A proposta prevê que a autoridade de trânsito comunique o cidadão por meio de SMS, aplicativo de mensagens ou e-mail, logo após a remoção do automóvel - mas não recomenda qualificar o serviço no “curral”, onde entrar é fácil, sair é complicado.

·Está chamando a atenção a omissão da UFPA em promover a vacinação em massa dos docentes e técnicos administrativos vinculados à instituição.

·A maioria já ultrapassa a casa dos 60 anos, sendo notoriamente envelhecido o quadro de servidores públicos da instituição.

·Essa OAB... A presença do candidato ao desembargo, Jarbas Vasconcelos, em evento recente da diretoria da Ordem, também deu pano para as mangas. Jarbas é ex-presidente, mas, mas...

·Um cabo de alta tensão perdeu altura sobre o canal que separa a cidade de Barcarena da Ilha do Carnapijó e ameaça a navegação.

·Como desgraça só quer começo, a população ansiosa espera por providências dos órgãos competentes - Marinha, MP, concessionária de energia elétrica, seja quem for.

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