Meio Ambiente

Coluna Ver Amazônia: Após ano mais quente, sopro de esperança brilha nos céus da Amazônia

O novo normal do clima causou perdas irreparáveis. Foi um ano de dores visíveis. Mas, em meio às cinzas, há esperança.

Mariluz Coelho/João Ramid | Especial para o POD

22/01/2025, 20:51

O mundo escondido dos pássaros no entorno de Belém


O ano de 2024 se despediu como o mais quente já registrado na história. A confirmação veio da Organização Meteorológica Mundial (OMM).  Pela primeira vez, a temperatura global ultrapassou temporariamente o limite de 1,5°C, superando o limiar climático crítico. 


Segundo a ONU, os últimos dez anos figuram entre os mais quentes já registrados nos arquivos climáticos globais, que remontam a 1850.


Em 2024, o calor extremo marcou o ritmo do planeta, escancarando os efeitos das mudanças climáticas. As florestas queimaram, os rios secaram, as enchentes destruíram vidas. O novo normal do clima causou perdas irreparáveis. Foi um ano de dores visíveis. Mas, em meio às cinzas, há esperança.


Registro da Aratinga Jandaya na APA do GUNMA. Foto: Danielson Aleixo


“Passarinhar” para preservar 


Nesta edição, não vamos deixar de mostrar a realidade preocupante do aquecimento do planeta, mas, abrimos um parêntese para falar de esperança através do canto e do colorido das aves. 


A Coluna Ver Amazônia observou e ouviu espécies na área de proteção ambiental do GUNMA, no município de Santa Bárbara do Pará, na Região Metropolitana de Belém, a capital da COP30.


Os biólogos Fernanda Freitas e Danielson Aleixo abrem as portas de um mundo que poucos conseguem enxergar (Instagram: @birdwatching)

Aparentemente, é apenas uma casinha na zona rural, um lugar bom para “ouvir o silêncio”. Porém, em poucos minutos de observação e quietude, notamos a existência de um mundo cujo os habitantes estão nas copas das árvores.


Para começar, nos deparamos com uma história de amor. Dani e Nanda são casados há quase oito anos e, juntos, tornaram-se protetores das aves neste pedacinho da Amazônia. O casal recebe os visitantes e registra os detalhes e a delicadeza deste incrível mundo da biodiversidade amazônica. 


Aves que habitam o birdwatching, em Santa Bárbara do Pará. Fotos: Fernanda Freitas e Danielson Aleixo.
  

O birdwatching é um lugar ainda pouco conhecido pelos paraenses e amazônidas. Os visitantes vêm de outros estados do Brasil e de países como França, Noruega e Itália, situados na Europa.


Beija-flor-de-barriga-branca no ninho, um momento raro registrado pelo biólogo Danielson Aleixo.


Vida que pulsa e resiste


Trilhas que se confundem com passeios logo se transformam em aulas sobre a natureza e sua diversidade


Fomos convidados a caminhar por trilhas no meio da floresta preservada. Mas, o que parecia um simples passeio, logo se mostrou uma aula sobre a incrível biodiversidade da Amazônia.


No caminho, Nanda e Dani explicaram e mostraram os detalhes escondidos na floresta. Cogumelos coloridos, árvores centenárias e, principalmente, o canto das aves.


Com binóculos e máquina fotográfica para registrar, fomos guiados pelo som vindo da mata densa. Observar aves é entrar em um mundo que está logo acima das nossas cabeças, mas, na correria do dia a dia, não percebemos.


Qualquer descrição sobre a atividade de observação de pássaros estará aquém da sensação de viver àquele momento. Nota-se uma quantidade enorme de aves em um pequeno trajeto. Elas estão escondidas na copa das árvores e entre as folhas.


Guardiãs da floresta, agentes do reflorestamento


A Saíra-negaça dispersa sementes pela vegetação. Foto: Danielson Aleixo.


Na floresta amazônica, muitas aves desempenham um papel essencial na manutenção dos ecossistemas. Entre as espécies que observamos, a maitaca-de-cabeça-azul se destaca por seu papel na natureza.


Apaixonada por açaí, ela se alimenta dos frutos e, depois da digestão, espalha as sementes pelo ambiente, contribuindo para a regeneração da vegetação.


Maitaca-de-cabeça-azul. Foto: Fernanda Freitas. (Detalhes no “Ver Amazônia” em vídeo)

Pesquisas indicam que as aves são as maiores reflorestadoras de áreas degradadas, como pastagens. “Elas precisam de um ambiente natural fonte para se alimentar. Quando pousam em áreas degradadas, na digestão semeiam novas árvores, auxiliando na recuperação desses espaços”, explica a bióloga.


O tucano Araçari-de-bico-branco, na APA GUNMA, contribui para regeneração de florestas. Foto: Danielson Aleixo.


Sensibilidade para perceber as aves


No entorno da observação de aves, em Santa Bárbara do Pará, o silêncio é fundamental. As aves reagem a qualquer som diferente. No ecossistema, tudo está conectado e funciona como uma orquestra.


O canto de cada pássaro tem um propósito. É uma forma de comunicação entre eles e também deles com os demais animais moradores das florestas.


Algumas aves cantam para alertar sobre um perigo na mata, como a presença de um predador. Nanda chamou nossa atenção no momento em que vários pássaros cantavam insistentemente. Naquele instante, avistamos um gavião. “Eles fazem barulho para alertar as outras espécies da presença do gavião, o predador”, explica a bióloga.


Os biólogos identificam o predador como o gavião ripina, que se alimenta de grandes insetos, como gafanhotos. “Os beija-flores fazem barulho para alertar sobre o predador e tentar espantá-lo”, explicam.


Gavião ripina, predadador conhecido. (Detalhes no “Ver Amazônia” em vídeo)


Um tucano diferenciado


Durante a observação de aves, encontramos o tucano-de-papo-branco, uma espécie amazônica pouco conhecida até pelos próprios moradores da região. Ele acaba sendo ofuscado pelo tucano-toco, encontrado principalmente no Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil, mais famoso e presente em gravuras e artesanatos.


Esse desconhecimento reforça a importância da educação ambiental para valorizar a biodiversidade única da Amazônia.


tucano-de-papo-amarelo, o verdadeiro tucano da Amazônia. Foto: Fernanda Freitas.


Tucano-de-papo-branco, com bico cor de açaí. Foto: Danielson Aleixo.


Beija-flor topetinho-do-Brasil-Central


Nanda e Dani já identificaram 312 espécies de aves no entorno do birdwatching, em Santa Bárbara do Pará. O que impressiona é a variedade dessas espécies.  Existem vários tipos de papagaios, urubus, beija-flores e gaviões, por exemplo.


Topetinho-do-Brasil-Central - raridade no birdwatching. Foto: Damilice Mansur.

Ameaças que vêm da cidade 


O barulho produzido pela vida moderna nas metrópoles abafa a beleza da presença dos pássaros. Um estudo australiano divulgado na revista científica Science descobriu que os ruídos afetam as aves a partir dos ovos, e seguem durante toda a vida no meio ambiente. 


Em Belém, a cidade da COP 30, as aves se protegem na copa das árvores na “selva de pedras”.


A pesquisa expôs ovos aos ruídos e acompanhou os animais no período de quatro anos. O estudo concluiu que a poluição sonora afeta a saúde, o desenvolvimento e a capacidade de reprodução das aves. 


Em Belém, a fotografia mostra o que normalmente os olhos apressados deixam de ver.


Os efeitos danosos dos ruídos na vida das aves levantam um alerta sobre os riscos de ambientes cada vez mais barulhentos. Isso destaca a necessidade de medidas para proteger a fauna e minimizar os danos causados ao meio ambiente. 


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Farol Ver Amazônia


Tom da COP30 1 

A ONU já começa a dar o tom do discurso oficial que levará à COP30, em Belém, de 10 a 21 de novembro deste ano. O primeiro ponto, bastante evidente, será a proposta de revisão dos parâmetros do Acordo de Paris, que está desatualizado diante da realidade dos riscos climáticos no planeta. 


Tom da COP30 2 

Nos bastidores, sabe-se que o principal foco do discurso oficial da ONU na COP30 será a preservação das florestas para a redução das emissões que causam o efeito estufa e o aquecimento global. A conferência deverá revisitar os acordos da Rio-92 e discutir o desmatamento da Amazônia.


Alvo Amazônia

A preservação das florestas é fundamental no contexto do aquecimento global. No entanto, isso pode desviar a atenção de questões igualmente relevantes, como o financiamento de ações climáticas pelos países mais ricos, que também são os maiores responsáveis pela emissão de CO, contribuindo para o aquecimento do planeta.


Geleiras 1

O lançamento do Ano Internacional para Preservação das Geleiras será em 21 de janeiro. A iniciativa de 2025 será liderada pela OMM e pela Unesco, com foco na conscientização sobre o papel dos glaciares no clima e no ciclo hidrológico. 


Geleiras 2

A ONU alerta para os impactos do derretimento das geleiras e busca promover políticas sustentáveis de preservação. Países-membros, agências da ONU e entidades científicas foram convidados a participar da iniciativa de mitigação dos riscos.





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