O Ministério Público Federal (MPF) apresentou uma proposta
de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) à empresa Eletrobras Eletronorte para
a regularização da licença ambiental da usina hidrelétrica Curuá-Una, em
Santarém (PA). A proposta busca corrigir irregularidades identificadas na
operação da usina, que vêm causando impactos socioambientais à Terra Indígena
Munduruku e Apiaká do Planalto e às comunidades ribeirinhas e extrativistas da
região.
Uma escuta pública realizada pelo MPF em outubro de 2024
demonstrou graves impactos ambientais, como a poluição das águas dos rios
Curuá-Una e Moju, efeitos danosos à saúde humana, com surtos de doenças
gastrointestinais e malária, além de interferências na organização social das
comunidades tradicionais.
A minuta do TAC, elaborada pelo procurador da República
Vítor Vieira Alves, propõe a regularização da licença ambiental concedida pela
Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas) para o
funcionamento da usina, sem gerar suspensão da operação. A medida principal
prevista é a realização de um diagnóstico socioambiental completo das
comunidades e aldeias afetadas pela hidrelétrica.
De acordo com a proposta, a Eletrobras Eletronorte deverá
apresentar, em até 30 dias após a assinatura do compromisso, um plano detalhado
de trabalho para a realização do diagnóstico socioambiental, incluindo a
participação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), dos indígenas e
das comunidades tradicionais afetadas. O estudo deverá ser conduzido por equipe
multidisciplinar independente da empresa e aprovada pelo MPF.
Consulta prévia – Pelo TAC proposto, a Eletrobras
Eletronorte deverá cumprir rigorosamente as previsões legais, constitucionais e
convencionais relacionadas à proteção ambiental e aos direitos dos povos
indígenas e demais comunidades tradicionais, com especial atenção à Consulta
Prévia, Livre e Informada (CPLI), incluindo, entre outras medidas, a garantia
de ampla participação dos indígenas e demais membros das comunidades nas
reuniões e escutas agendadas, conforme estabelecem a Convenção 169 da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Protocolo de Consulta da Terra
Indígena Munduruku e Apiaká do Planalto.
O TAC estabelece que o diagnóstico preliminar deve ser
apresentado em até 180 dias após o início dos estudos, e o relatório final em
até um ano. Esses dados servirão para subsidiar um futuro TAC, que tratará
especificamente sobre compensação financeira e/ou disponibilização de políticas
públicas às localidades afetadas.
A proposta também exige que a Eletrobras Eletronorte
implemente imediatamente um sistema de alertas sonoros ou outros tipos de
avisos para comunicar as comunidades sobre a abertura e fechamento das
comportas da usina, além de criar canais de comunicação acessíveis para os
indígenas e comunitários.
Entenda o caso – A proposta de TAC foi elaborada
pelo MPF como um dos resultados de inquérito instaurado inicialmente para
apurar a instalação de uma quarta turbina na usina sem a consulta aos povos
indígenas potencialmente afetados. No entanto, durante as investigações, foi
constatado que desde a instalação da usina hidrelétrica, em 1977, nunca
houve medidas para identificar e reparar os danos sociais e ambientais causados
às comunidades.
Na minuta do acordo, o MPF detalha que o contexto de
instalação da hidrelétrica era o de plena Ditadura Empresarial-Militar, em que
prevalecia o silenciamento de indígenas e ribeirinhos que tradicionalmente
ocupam a Amazônia. Nesse cenário, qualquer reivindicação contra projetos do
tipo poderia ser duramente reprimida.
“Embora a hidrelétrica Curuá-Una tenha iniciado seu
funcionamento antes do início de vigência das principais normas ambientais,
isso não impede a reparação dos danos socioambientais que permanecem a cada
renovação da licença de operação. E a reparação desses danos causados pelo
empreendimento ao longo dos anos se baseia não apenas no Direito Ambiental, mas
também na Justiça de Transição, por se tratar de uma construção erguida durante
a Ditadura Militar”, pontua o procurador da República Vítor Vieira Alves. Além
do direito à memória e verdade, a Justiça de Transição também inclui o direito
à reparação, inclusive coletiva.
Fonte: MPF
Foto: Reprodução