O crime compensa. A suprema degeneração do Judiciário do Brasil e a subversão da República

Uma análise sobre o significado político e sociológico das mais recentes e espúrias decisões monocráticas de juízes do STF.

Por Alex Fiúza de Mello | Sociólogo e Cientista político

03/11/2024 08:00
O crime compensa. A suprema degeneração do Judiciário do Brasil e a subversão da República
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om a anulação processual, esta semana - por decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes -, da condenação do ex-deputado e ex-chefe de Gabinete da Presidência da República José Dirceu, e do ex-governador do Rio de Janeiro Luiz Fernando Pezão, decisão igualmente monocrática do ministro André Mendonça - não obstante posição em contrário da Procuradoria-Geral da União -, o Supremo Tribunal Federal acaba de cumprir, mais uma vez, com base em subterfúgios “tecnicistas” ardilosos - comme d’habitude -, o que parece ser, nos últimos tempos - a contar das tantas outras medidas em favor de condenados da Lava Jato favorecendo parlamentares comprovadamente corruptos e de líderes do narcotráfico -, a sua mais “nobre” e, ao que tudo indica, única - ou principal - missão: a defesa dos interesses da cleptocracia triunfante.


Últimas decisões - todas monocráticas - devolveram a José Dirceu e ao ex-governador do Rio de Janeiro Luiz Fernando Pezão a condição de “ficha-limpa”/Fotos: Divulgação.

Missão dada, executada

 

Nada surpreendente no âmbito da alçada de ministros togados que, ao fim e ao cabo, por questões exclusivamente de natureza política, não foram nomeados - em sua ampla maioria - por razões de foro republicano, tampouco de defesa da Justiça, da ordem jurídica e da Constituição; mas justo para exercerem o papel de salvaguardas, “em última instância”, do sistema político dominante, eivado de criminosos de colarinho branco, a quem devem a honraria do cargo - para o qual não tinham os requisitos técnicos e morais à ocupação - e diante dos quais estão “geneticamente” subordinados e reféns - inclusive por meio de chantagens, se necessário.

 

Disfarçados em seus fantasiosos mantos, tal qual sepulcros caiados, mas sorvidos, indistintamente, de parvidade temperada de arrogância e pedantismo, não passam, hoje - e infelizmente -, “suas excelências”, de meros lacaios de seus mandantes, atuando conforme as ordens e inclinações emanadas de seus abstrusos - nem sempre evidentes - “superiores”.

 

Ao gosto do freguês

 

Para tal, forçosa e inescrupulosamente, conforme a circunstância e a patente do “paciente”, sem qualquer pudor ou decoro, absolvem criminosos a rodo, perseguem adversários por atos abusivos e ilegais, interferem em investigações e julgamentos em outras instâncias do Judiciário, desrespeitam a autonomia dos demais Poderes e distorcem, disfarçada e casuisticamente, sempre que imperativo, o texto constitucional, com o costumeiro e indisfarçável malabarismo hermenêutico.

 

Na arquitetura e engenharia do crime organizado, dadas as circunstâncias de conjuntura, o STF acabou se transformando em sua mais estratégica e avançada milícia de defesa e combate; no seu principal e mais proeminente agente de operação, ante a vexatória e repugnante “insolvência” do Congresso Nacional - particularmente do Senado -, vergonhosamente curvado, em enojosa subserviência, aos monarcas da capa preta.

 

A mando das oligarquias

 

Firmando-se, assim, como a mais proeminente - e estratégica - trincheira da “guerra brasileira” ora em curso, cumpre a Suprema Corte, passo a passo, no seu dia-a-dia, um roteiro meticulosamente planejado e encomendado por seus indefectíveis influencers, razão maior de seu ostensivo “ativismo judicial” e degeneração extrema: a retomada totalitária do poder por seus tradicionais e consuetudinários “proprietários”: as oligarquias patrimonialistas.

 

Sabe muito bem o sistema estamental vigente que são inúmeras e decisivas as batalhas ainda a travar no horizonte - incluída a manutenção do veto ao sistema de apuração eleitoral com voto impresso -, para as quais os enredos e papéis a serem performados já foram devidamente esquadrinhados e ensaiados pelos respectivos atores - da mesma forma que projetados os possíveis e sinuosos cenários, com as correspondentes táticas de luta em cada um deles.

 

Sem meio termo

 

Sim, o País está, efetivamente, em guerra. Ora vence - em definitivo - o tradicional e patrimonialista estamento oligárquico - neste momento, retornado ao poder -, ora as forças que lutam por um Brasil mais republicano e democrático - em que a vontade soberana da maioria do povo seja respeitada. Não há meio termo. E o crucial e mais relevante desafio, neste belicoso cenário, é o resgate e a refundação do STF como instituição máxima da Justiça e de defesa do Estado de Direito e da ordem verdadeiramente republicana - o que deixou de acontecer.

 

Verdugo da estabilidade

 

O maior drama do sistema político brasileiro, na atualidade, tem sido a degeneração do Poder Judiciário, capitaneada, paradoxalmente, pela mais alta Corte do País: o Supremo Tribunal Federal - incongruente verdugo da estabilidade jurídica e política e promotor de toda sorte de injustiça e iniquidade que afligem a sociedade nacional.

 

Pois o STF, totalitária e impunemente, conseguiu transgredir todos os princípios e orientações do recomendado constitucionalismo republicano moderno, servindo, hoje, de mau exemplo e antítese ao que preconiza a clássica  - e ainda atual - Teoria dos Três Poderes, da lavra de Montesquieu, ao exibir, entre os seus famigerados e aéticos magistrados, figuras arrogantes, traiçoeiras e debochadas, provenientes de uma seleção orientada por critérios tendenciosos e erráticos, ideológicos e não meritocráticos, cujo resultado não poderia ser outro que a disrupção do Estado democrático de Direito e a insolvência do pacto de 1988. 

 

Falência da democracia

 

Deve-se às suas excelências, ultima ratio, a falência da democracia constitucional brasileira e a sua substituição peremptória - orquestrada nas lacradas e invioláveis coxias do Tribunal - por outro ilegítimo regime político, hipocritamente negado e acolhido por “suas majestades” togadas: aquele do banditismo oficializado, da corrupção institucionalizada, do corporativismo autenticado.

 

E a falência social


O STF, na contramão do espírito das leis - e seu principal fraudador -, não passa, no presente e compungido contexto - graças à atuação de seu atual e indigno colegiado, e da omissão e cumplicidade do Senado Federal -, de fiador e guardião da cleptocracia reinante. Protagonista de primeira ordem e grandeza de seus malfadados e cabulosos desígnios. Coveiro-mor da República. Um tumor agressivo e invasivo, de “suprema” e lúgubre magnitude a condenar o País, por inteiro, à barbárie, ao óbito democrático e à aterradora falência social.

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