A tempestade perfeita: dilema do prefeito de Ananindeua pode abrir janela para voo de Hana

O Pêndulo de Foucault representa a percepção da realidade como algo relativo; na política, por essa perspectiva, o que se vê como fixo e absoluto pode estar se movendo.

Por Olavo Dutra | Colaboradores

07/07/2025, 11:15
A tempestade perfeita: dilema do prefeito de Ananindeua pode abrir janela para voo de Hana
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hove forte nas margens da Baía do Guajará. O aguaceiro fora de época parece encharcar a política paraense, que enfrenta, pela primeira vez desde 2018, uma disputa que se avizinha acirrada para 2026. E o campo está molhado.

 

A polarização política já não é a disputa em jogo no Pará; a única disputa real é a da continuidade ou não do mando de Helder Barbalho e de seu grupo/Fotos: Divulgação.

Helder Barbalho, governador reeleito em 2022 no primeiro turno, se consolidou não apenas como uma liderança local, mas também como uma figura influente no panorama nacional. Em que pesem as críticas e temores em relação à COP30, o peso de ter trazido o evento internacional dessa magnitude para a capital não é irrelevante; ao contrário. Sua administração, que começou em 2019, é caracterizada por investimentos significativos em infraestrutura - estradas, pontes e portos -, saúde - sobretudo expansão da cobertura hospitalar - e assistência, tendo as Usinas da Paz como carro-chefe - áreas que são importantes para um Estado historicamente mergulhado em profundas desigualdades sociais.

Helder Barbalho, filho do senador Jader Barbalho, carrega o legado de uma das dinastias políticas mais conhecidas do País. Seguindo uma prática arraigada no Brasil, a família Barbalho domina a política do Pará há décadas - o avô do governador, Laércio Barbalho, foi deputado estadual e diretor da Imprensa Oficial do Estado e o senador Jader Barbalho, pai de Helder, foi governador do Pará por dois mandatos. Ao longo dos anos, parentes dos lados da mãe e do pai de Helder Barbalho foram ocupando e se mantendo em cargos públicos. 

 Imaginário popular

Embora sua imagem de "governador trabalhador" tenha encontrado lugar no imaginário dos eleitores, a associação familiar levanta questões sobre a perpetuação das oligarquias políticas na região, o que se agravou com escolha de Igor Normando, seu primo, para a vitoriosa disputa pela Prefeitura de Belém, que ainda está devendo dizer a que veio. Frases como “quer dominar tudo”, “já chega!”, “Tem que largar o osso”, “essa família já tem muito”, começaram a ecoar fortemente em pesquisas qualitativas Estado afora.

O governador tem se mostrado hábil em navegar nas complexidades políticas, mantendo ainda altos índices de aprovação, mas os desafios que se avizinham começam a testar a solidez de sua base.

A escolha de Hana

A escolha de Hana Ghassan como sua sucessora é um movimento tático corajoso. Atual vice-governadora e Secretária de Planejamento, Hana é vista como uma gestora competente, mas um currículo que não inclui a desenvoltura política como atributo. Essa falta de experiência em disputas eleitorais e na articulação política de bastidores pode ser um obstáculo em um ambiente onde alianças são decisivas e a traição é serventia da casa. O Pará, terra de muro baixo, é um lugar onde a política é marcada por uma rede densa de compadrios, relações e interesses, muitos subterrâneos, e a habilidade de Hana em lidar com adversidades será vital.

A vice representa uma tentativa de renovação na continuidade, uma tentativa de tirar o sobrenome da família do leque de opções na disputa ao Executivo, mas sua capacidade de se distanciar das práticas da política tradicional e comunicar-se de forma eficaz com o eleitorado é que será determinante. Embora tenha melhorado muito, a ausência de empatia ainda é algo que a escolhida precisa superar. Em um momento em que o populismo e a retórica polarizadora tentam se firmar, mas já produzem repulsa em parte importante do eleitorado, sua proposta de continuidade segura pode impactar positivamente eleitores que buscam alternativas ao extremismo.

Flerte com extremos

Na “República de Ananindeua”, Dr. Daniel, um dos principais opositores de Barbalho, enfrenta sua própria tempestade. Seu flerte com a extrema direita, estimulado por boatos como de sua filiação ao PL do enfezado Eder Mauro, ou ao Podemos de Zequinha Marinho, o breve, pode conduzi-lo da voz moderada que tem hoje para a adoção de uma retórica polarizadora em um Estado que abriga uma diversidade de vozes e demandas sociais que tornaria o rótulo do bolsonarismo um fardo pesado demais numa disputa tão acirrada. O eleitorado paraense, que historicamente valoriza a pluralidade, pode não aceitar bem essa aproximação, principalmente considerando as recentes mobilizações sociais em torno de questões como direitos humanos, meio ambiente e justiça social que foram, de fato, as únicas iniciativas que colocaram em xeque o poder do clã Barbalho. 

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Um exemplo foi a ocupação da Seduc por lideranças indígenas do oeste paraense, que levou à derrubada do poderoso secretário de Educação Rossiele Soares, um recuo ao qual se somou outro: o cancelamento da extinção da Funtelpa e da Fundação Cultural do Pará, cujo decreto já tramitara na Assembleia Legislativa e cuja anulação também foi provocado por intensa mobilização dos setores progressistas da sociedade.

A polarização política em nível federal, refletida na permanência em cena de figuras como Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva, obviamente impacta a política local. Mas, como mencionado em artigo anterior da Coluna Olavo Dutra, essa não é a disputa que está em curso no Pará, onde a única disputa real é a da continuidade ou não do mando de Helder Barbalho e de seu grupo.

O prefeito Daniel Santos, se buscar se alinhar exclusivamente com a pauta nacional abraçando esses discursos exógenos, pode alienar uma parte significativa do eleitorado que deseja uma governança técnica, mais centrada, capaz de dialogar com as demandas sociais emergentes e transitar por uma via onde a pragmática substitua o lero-lero ideológico, que “não enche a barriga de ninguém”.

Janela para o futuro

É justamente o dilema que Dr. Daniel enfrenta que pode abrir a grande janela de oportunidade para Hana Ghassan. Sua maior chance de abolir a ideia de que não terá consigo a força política que Helder tem é se alinhar ao centro, que decidirá a eleição não de olho nas cartinhas de direita ou esquerda, mas na solução dos problemas do dia a dia de um Estado carente. 

Sua inexperiência, longe de ser um impedimento, pode se tornar um diferencial em um momento em que a desilusão com a política tradicional cresce e o fato de ser mulher, especialmente se ela apresentar uma chapa exclusivamente feminina, tende a ajudar Hana na articular uma mensagem clara de uma transição segura, moderada, “uma mudança na continuidade”, como expressou nosso consultor político Jota Neto, o que poderá atrair tanto a base de Helder Barbalho quanto aqueles que anseiam por uma alternativa ao extremismo e a soma desses votos representam hoje a maioria.

À medida que 2026 se aproxima, a habilidade de Hana em construir alianças e se conectar com a população será fundamental e mais importante do que consolidar os acordos internos com parlamentares e gestores, cuja amarração estará a cargo do próprio governador, que deve disputar uma vaga ao Senado.

Método Helderiano

O método Barbalho de amarração de chapa pode ser um obstáculo para Hana. Se ele optar pelo “soma zero” na composição do vice, como fez em 2024 em Belém ao optar por Cássio Andrade - que não somava um único voto ao candidato por representar o mesmo perfil de Igor Normando -, a situação de Hana complica. Ela precisa ao seu lado de alguém que tenha popularidade e carisma, justamente para compensar esses hiatos em sua trajetória.

Todos reconhecem que o Pará se encontra em uma encruzilhada, tendo diante de si, de um lado, a possibilidade de um novo ciclo político, onde uma nova liderança pode oferecer esperança em um Estado que é um celeiro de culturas, desafios e oportunidades, e de outro, a possibilidade de trazer para o debate local uma polarização que o tempo já está deixando para trás, como mostra a última pesquisa Quest, segundo a qual 60% dos eleitores não querem nem o nome de Lula nem o de Bolsonaro na cédula eleitoral de 2026.

Cenário de incertezas

Com dois candidatos claramente configurados, o futuro político do Pará está repleto de incertezas, mas também de promessas. O legado da gestão de Helder Barbalho e a candidatura de Hana Ghassan podem ser a chave para um novo capítulo na história do Estado. Enquanto os ecos da polarização que seduz parte do entorno de Dr. Daniel reverberam, a política paraense se posiciona em um ponto de inflexão, onde o equilíbrio entre permanência e renovação será determinante.

A próxima eleição não será apenas uma disputa por votos; será uma batalha pela identidade e pelo futuro de um Estado rico em diversidade e em busca de evolução.

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