Ministra Marina Silva sob suspeita: é ‘madrinha’ de Ong que torrou R$ 24 mi em viagens e consultorias

Instituto de Pesquisa Ambiental recebeu R$ 35 milhões do Fundo Amazônia e torrou 80% do valor indevidamente; CPI abre procedimento para investigar suposta promiscuidade nas relações com a ministra que barrou a exploração de petróleo na Costa do Amapá.

Por Olavo Dutra | Colaboradores

22/10/2023, 11:00
Ministra Marina Silva sob suspeita: é ‘madrinha’ de Ong que torrou R$ 24 mi em viagens e consultorias
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enúncia envolvendo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, levou à abertura de um pedido de investigação e deitou um véu de suspeita sobre as relações de Organizações Não-Governamentais e estruturas governamentais, nesse caso, o Ministério do Meio Ambiente. De acordo com a denúncia, o Ipam teria recebido R$ 35 milhões do Fundo Amazônia em 2022 e utilizado 80% desse valor, ou seja, R$ 24 milhões, em consultorias e viagens.


A jornada de Marina Silva no governo Lula inclui atropelos, denúncias de malfeitos, pelo deputado Nikolas Ferreira, proibição da exploração de petróleo na Costa do Amapá e quebra de acordos políticos com Randolfe Rodrigues e Heloisa Helena/Fotos: Divulgação.

 A revelação foi feita durante uma reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga a atuação de Organizações Não-Governamentais na Amazônia, conhecida como "CPI das Ongs".

 

Durante o encontro, o diretor-executivo do Ipam, André Guimarães, foi questionado sobre o envolvimento da ministra Marina Silva com a organização. O senador Jaime Bagattoli, do PL-RO, perguntou sobre a formação do conselho do instituto, ao que Guimarães respondeu que é composto por pessoas com conhecimento na área, principalmente acadêmicos e cientistas. O presidente da Comissão, senador Plínio Valério, do PSDB-AM, então questionou se a ministra fazia parte do conselho, e Guimarães explicou que ela não tem um cargo oficial, mas é homenageada como conselheira honorária. Essa relação foi criticada pelos parlamentares, sendo chamada de "promíscua" pelo relator da CPI, senador Márcio Bittar, do União-AC.

 

Recursos milionários

 

A CPI levantou documentos que mostram que 80% das verbas públicas recebidas pelo Ipam foram utilizadas em viagens nacionais e internacionais. Os principais doadores do Fundo Amazônia são a Alemanha e a Noruega. Guimarães rebateu as críticas, afirmando que um projeto de assentamentos sustentáveis na Amazônia, que recebeu R$ 25 milhões do Fundo Amazônia, beneficiou mais de 2 mil famílias, aumentando sua renda em 135%. Além disso, segundo ele, o projeto reduziu o desmatamento na região em 70%. Para Guimarães, essa iniciativa serve como modelo para os financiamentos que a Ong continua recebendo do Fundo Amazônia.

 

A participação da ministra Marina Silva no Ipam também foi questionada durante a reunião da CPI. A comissão, instalada em junho, tem como objetivo investigar a liberação de recursos públicos para Ongs e Oscips pelo governo federal, bem como a utilização desses recursos pelas entidades. Os parlamentares levantaram dúvidas sobre a atuação da ministra junto ao órgão, já que ela também faz parte do Comitê Orientador do Fundo Amazônia, de acordo com a CPI.

 

Relações promíscuas

 

O relator Marcio Bittar questionou se não seria promíscuo uma pessoa que ocupou um ministério por mais de sete anos ser madrinha de uma Ong que recebe verbas públicas. Guimarães defendeu a ministra, afirmando que ela deixou o governo federal em 2009, enquanto o Fundo Amazônia foi iniciado em 2013.

 

Além disso, foi revelado que a Secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni, indicada por Marina Silva, também compôs o conselho deliberativo do Ipam, que recebeu recursos públicos milionários. Em 2012, a Ong assinou um contrato com o BNDES no valor de R$ 23,4 milhões, supostamente para apoiar famílias assentadas pelo Incra comprometidas com a redução do desmatamento no oeste do Pará. Essa revelação levanta mais questionamentos sobre a atuação do Ipam e suas relações com a ministra do Meio Ambiente.

 

Diante dessas denúncias, o deputado federal Nikolas Ferreira, do PL-MG, protocolou um pedido de abertura de investigação contra a ministra Marina Silva por suposto mau uso de verbas públicas. A CPI das Ongs continua seu trabalho de fiscalização das atividades das organizações na Amazônia e a utilização dos recursos públicos destinados a elas.

 

Rede de intrigas

 

Esse não é o primeiro imbróglio envolvendo Marina Silva em 2023. A ambientalista foi eleita deputada federal por São Paulo com uma votação aquém da esperada. Seu grupo estimava uma votação acima de 500 mil votos - “entre 500 e 600 mil” - e obteve pouco mais de 230 mil votos, sendo beneficiada pela votação de Guilherme Boulos, do Psol, que integrava com ela a mesma federação, Psol-Rede.

 

O curioso é que Marina Silva foi contra a formação da federação com o Psol e lutou abertamente em seu partido por um arranjo com o PDT de Ciro Gomes, a quem apoiou no primeiro turno, mesmo que a deliberação de seu partido fosse de apoio a Lula desde o primeiro turno. A disputa em torno das candidaturas de Lula e Ciro - de quem Marina era cotada para ser vice - e da formação da federação com o Psol, geraram fortes antagonismos entre Marina e o senador Randolfe Rodrigues, da Rede-AP, que abraçou a candidatura do ex-presidente desde a primeira hora. A cisma se aprofundou quando Rodrigues abriu mão do Ministério das Comunicações, oferecido a ele por Lula, para pavimentar o caminho de Marina, então sua companheira de partido, em direção ao Ministério do Meio Ambiente. Após assumir o cargo, no entanto, Marina recusou-se a abrir espaço para que Rodrigues e seus companheiros de partido compusessem o staff do ministério, o que passou a ser decidido exclusivamente pelo grupo paulistano da ministra.

 

Esse e outros fatores levaram à ruptura entre Marina e a ex-senadora Heloísa Helena, que derrotou Marina no congresso partidário e assumiu a posição de principal liderança e porta-voz da Rede Sustentabilidade.

 

Marina “do atraso” 

 

"Neste momento, saio daqui sangrando". A frase é de Marina Silva e foi pronunciada após o resultado da disputa no congresso da Rede Sustentabilidade, que sagrou como vencedora a chapa 'Rede Vive Pela Base', encabeçada pela ex-senadora Heloísa Helena e pelo engenheiro ambiental Wesley Diógenes, apoiados pelo senador e líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues.

 

Durante os debates, adversários chegaram a afirmar que Marina ofereceu cargos em troca do apoio à sua chapa e que a ministra seria "amiga de banqueiros", devido a suas relações próximas com Neca Setúbal, herdeira do banco Itaú. Mesmo ausente dos debates, Randolfe comemorou o resultado. 

 

A crise entre ele e Marina escalou quando a ministra apoiou o parecer do Ibama que impedia a Petrobras de explorar petróleo no litoral norte da Amazônia, parte oceânica distante centenas de quilômetros do Estado do Amapá, alegando questões técnicas. Senador eleito pelo Amapá, Randolfe passou a ser atacado por adversários políticos locais, sob alegação de que seu partido estava “impedindo o crescimento econômico e a geração de empregos” que os royalties do petróleo produziriam.

 

Em razão disso, mesmo sabendo que essa não era uma decisão da Rede e sim de Marina e seu staff, Randolfe desfiliou-se do partido, afirmando em nota seu “compromisso com o meio ambiente, mas também com a garantia de trabalho e renda para a população de seu Estado”. Amigo de Heloisa Helena, Randolfe foi um dos principais apoiadores de sua permanência na liderança da legenda.

 

Além do horizonte

 

Para o senador, o potencial econômico da exploração da região - que já está sendo feito por outros países como as Guianas - pode inclusive financiar a transição energética tão necessária. “O debate sobre o potencial petrolífero da Margem Equatorial envolve reservas de 30 bilhões de barris e quase US$ 3 bi em investimentos. A Amazônia, pobre e com um povo desassistido, não tem como abrir mão desse capital para financiar o desenvolvimento econômico e a transição energética”.

 

A chamada Margem Equatorial é uma região situada no litoral entre os Estados do Amapá e Rio Grande do Norte. Próxima à Linha do Equador, a área se estende por mais de 2.200 km ao longo da costa. A Petrobras contesta Marina e sua equipe. Afirma que atendeu a todos os requisitos do Ibama no processo de licenciamento; que a área em que pretende perfurar o poço está a 175 km da costa do Amapá e a mais de 500 km da foz do Rio Amazonas.


Marina, por sua vez, veio a público novamente rebater a Petrobras, afirmando que “não pode haver concessões para questões técnicas”. A polêmica chegou até a Advocacia-Geral da União, que firmou parecer de que é possível conceder licenciamento mesmo sem avaliação preliminar da área concedida - contestando tecnicamente Mariana e o Ibama, que negaram a licença em maio e seguem fincando o pé na mesma posição.

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