Um senador na corda bamba: Beto Faro, do PT, e o efeito cascata na política paraense

O que será do senador cassado pela Justiça Eleitoral do Pará ainda é um livro fechado, mas as especulações apontam para um final sombrio.

Por Olavo Dutra | Colaboradores

25/05/2025, 08:00
Um senador na corda bamba: Beto Faro, do PT, e o efeito cascata na política paraense
“T


udo é Óbvio”, livro escrito por Duncan J. Watts, é uma obra que explora a complexidade do comportamento humano e a forma como as decisões são tomadas em um mundo repleto de incertezas. Watts, um renomado sociólogo e físico, desafia a ideia de que o comportamento humano pode ser facilmente previsto ou compreendido, mesmo com a utilização de dados e modelos.

Última pesquisa Doxa aponta possíveis candidatos ao Senado, mas nova eleição precisa ser confirmada pelo TSE para substituição de Beto Faro/Fotos: Divulgação.
A cassação do mandato do senador Beto Faro, do PT, pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Pará, por 5 votos a 2, não é apenas um tremor no cenário político do Pará. Ela se ancora na premissa central da obra de Duncan J. Watts: o que parece evidente após o fato consumado, muitas vezes é irremediavelmente imprevisível em sua origem.

A decisão do TRE, pautada em um "robusto conjunto probatório" que detalha ilícitos como corrupção, captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico, aponta a empresa Kapa Capital como o epicentro de um esquema "sistêmico". A clareza com que o relator, juiz Marcus Alan Gomes, descreve as metas de votos, as recompensas em tickets alimentação e a pressão sobre funcionários para cooptar eleitores, tudo reforçado por uma gravação ambiental, sugere uma obviedade na conduta.

No entanto, é aqui que as lentes de Watts se apresentam. A "serenidade" da defesa de Beto, revelada em nota divulgada logo após o veredito, pode ser vista não apenas como uma estratégia jurídica, mas como consequência da paralisia produzida pelo inesperado. Watts argumenta que, embora os eventos passados possam ser analisados e compreendidos com uma lógica retroativa, a teia de fatores que os gerou é intrinsecamente complexa e influenciada por elementos imprevisíveis. Se o julgamento tivesse acontecido antes, teria o mesmo desfecho?

A denúncia contra Beto Faro, com todos os seus detalhes e provas, é um caso de estudo sobre como o comportamento humano, de como as decisões e os resultados são moldados por uma interação de variáveis que nem sempre são captadas por modelos simples. A cassação do senador, que para muitos pode parecer um desfecho "óbvio" diante das evidências apresentadas, levanta a questão que Watts tanto enfatiza: o quão previsível era esse resultado em meio à complexidade da política, das relações humanas, do poder político empregado e das variáveis eleitorais?

A "bomba" que a decisão do TRE joga no tabuleiro político paraense não é apenas sobre a perda de um mandato, mas sobre a incerteza que ela gera. "E agora?", a pergunta que surge, sintetiza a essência da obra de Watts. O futuro político de Beto Faro, as consequências para o PT no Pará e o impacto na dinâmica eleitoral local são elementos que, por mais que se tente prever, estão sujeitos à aleatoriedade e à complexidade dos sistemas sociais e das movimentações políticas, desafiando a noção de que tudo é, de fato, óbvio.

Jantar onde o senador
foi o prato principal

Por acaso, no exato momento em que o TRE do Pará proferia a decisão que cassava o mandato de Beto Faro, um evento promovido pelo próprio parlamentar em Brasília se transformava em um foco de constrangimento e debandada. O jantar, organizado na residência oficial do senador, reunia prefeitos paraenses que estavam na capital federal para a Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, evento que contou com a presença do presidente Lula e reuniu chefes de Executivos municipais de todo o País.

A notícia da cassação, que se espalhou rapidamente, jogou um balde de água fria no ambiente, gerando um mal-estar visível entre os presentes. Prefeitos, muitos deles eleitos com o apoio ou a articulação de Beto Faro, viram-se em uma situação delicada. O que era para ser um encontro de celebração e articulação política transformou-se em um episódio de debandada geral, à medida que a repercussão da decisão do TRE atingia o local. Esse incidente sublinha não apenas o peso da decisão judicial, mas também a rapidez com que as consequências políticas de tal veredito se manifestam, impactando a imagem e a capacidade de articulação do senador em tempo real.

Fator HB: derrota
ou estratégia?

A cassação de Beto Faro levanta a inevitável pergunta sobre o papel de Helder Barbalho, o governador que "carregou nas costas" a eleição do petista em 2022. Seria essa uma derrota para Helder? Ou o governador, conhecido por sua perspicácia política, teria feito "corpo mole", deixando Beto Faro à mercê de um TRE que, sob a presidência de José Maria Teixeira do Rosário, tem se mostrado implacável na punição de compra de votos?

É uma análise complexa. Se, por um lado, a perda de um senador alinhado ao seu grupo político no Congresso Nacional representa um revés, por outro, Helder pode se desvencilhar de um problema que, se arrastado, poderia respingar em sua gestão. A imagem do governador, já consolidada, talvez não será abalada de forma por essa decisão, especialmente se ele conseguir se posicionar como um agente de estabilidade em um cenário de turbulência. A tese do "corpo mole" é tentadora, mas difícil de ser comprovada. O que se sabe é que Helder é um jogador de longo prazo e sua capacidade de adaptação é notória.

Futuro de Beto Faro
a Deus pertence?

Para Beto Faro, o cenário é de incertezas, mas ele segue no mandato. O recurso ao TSE garante que ele continue exercendo suas funções enquanto o processo tramita. O rigor com que o TSE tem se comportado diante de teses como a corroborada pelo TRE paraense, no entanto, sinaliza para um desfecho negativo ao senador. A duração desse trâmite é a grande incógnita, podendo se estender por meses ou até anos, potencialmente se chocando com as eleições de 2026.

Mas, o que fará Beto agora? A decisão do TRE, mesmo que passível de recurso, já é um golpe duro em sua imagem e em sua trajetória política. A suposta indicação de Beto para ocupar um ministério no governo Lula, que vinha sendo ventilada, foi colocada em xeque. A imagem de um ministro condenado por compra de votos é algo que o Palácio do Planalto provavelmente não desejaria ter, especialmente em um governo que precisa reforçar a pauta anticorrupção.

Localmente, a perda desse poder de articulação e influência é significativa. Beto Faro detém secretarias e cargos tanto na Prefeitura de Belém quanto no governo do Estado, frutos de sua ascensão política e de sua proximidade com os grupos no poder, tanto no Pará quanto em Brasília. Se a cassação for confirmada, sua capacidade de indicação e de movimentar a máquina pública sofrerá um revés de dimensões catastróficas.

E sua liderança no PT no Pará? Sem o mandato de senador e com o desgaste da imagem, Beto Faro pode perder protagonismo para o ex-senador Paulo Rocha, que atualmente comanda a Sudam e que tem Beto como um desafeto. Rocha, uma figura histórica do PT paraense, tem um capital político consolidado e, em um momento de fragilidade de Faro, pode ressurgir como a principal voz do partido no Estado. O silêncio de Paulo Rocha diante da cassação do colega de partido vale por um discurso.

Nova eleição e os
possíveis candidatos

Caso a cassação de Beto Faro seja confirmada pelo TSE, uma nova eleição para o Senado no Pará se tornará uma realidade. E o rol de possíveis postulantes já começa a se desenhar, trazendo nomes de peso e com históricos controversos.

Pesquisa Doxa publicada semana passada mostra um leque amplo de concorrentes na disputa. O primeiro voto tem a liderança do governador Helder Barbalho, com 23,8%. Ele é seguido pelo ex-senador Mário Couto, com 16,5%; Celso Sabino, com 11,2%; Ursula Vidal, com 7,8%; Deputado Chicão, com 6,9%; Simão Jatene, com 6,1%; Zequinha Marinho, com 4,7%; Rogério Barra, com 4,5%; vereador Lulu das Comunidades, com 1,9% e o deputado Dirceu ten Caten, com 1,2%.

Na escolha pelo segundo voto para o Senado se destacam Mário Couto, com 19,5%; Celso Sabino, com 13,2%; Helder Barbalho, com 10,2%; Úrsula Vidal, com 10,2%; deputado Chicão, com 10,1%; Simão Jatene, com 8,1%; Zequinha Marinho, com 5,4%; Rogério Barra, com 4,6%; Lulu das Comunidades, com 2,0%; Dirceu ten Caten, com 1,3% e Adolfo Neto, com 0,8%.

Mário Couto se destaca em ambos os cenários. Sua capacidade de mobilização e seu histórico de votos, mesmo com as controvérsias, o tornam um adversário a ser batido. A memória do eleitor, nesse caso, será um fator decisivo.

 Outro nome que tem se colocado é o de Celso Sabino, deputado federal e atual Ministro do Turismo. Sabino largaria o ministério para disputar essa cadeira no Senado? A chance de se tornar senador, com o peso de um cargo federal e o capital político acumulado, pode ser uma tentação poderosa. No entanto, deixar um ministério, mesmo que para um cargo eletivo, é uma decisão que exige muita frieza e cálculo político.

E Helder Barbalho? Renunciaria ao governo para disputar essa cadeira no Senado? Essa é a mais ousada das especulações. Embora seja um movimento que já aconteceu na política brasileira, com governadores buscando o Senado, no caso de Helder, que tem um projeto de sucessão em andamento, parece pouco provável. Ele ainda tem chão a percorrer como governador e a corrida ao Senado, por mais importante que seja, a essa hora, pode desviar o foco de sua administração e de seus planos futuros.

Como lembra Watts, o acaso, ou a aleatoriedade, desempenha um papel significativo na história cultural e política das comunidades e pode influenciar eventos de maneiras inesperadas e, muitas vezes, decisivas.

A saga de Beto Faro, desde a Fetagri até o Senado, é uma série que mistura determinação e acaso e está longe de um desfecho. A decisão do TRE é apenas o primeiro capítulo de um imbróglio jurídico-político que promete movimentar os bastidores do poder no Pará nos próximos meses, redefinindo alianças, testando lealdades e reacendendo antigas rivalidades. O correr dos fatos dirá quem sairá fortalecido e quem terá que recalcular a rota. 

Como escreveu Watts, “quando você pensa em quão complexos esses jogos da vida podem ser, parece meio incrível que sejamos capazes de jogá-los”. 

Papo Reto

Prova de que as decisões do Superior Tribunal de Justiça são demoradas é o caso da eleição que deu à prefeita Patrícia Alencar (foto) mais quatro anos de mandato em Marituba, Região Metropolitana de Belém. 

•A vice da atual prefeita é acusada de irregularidade eleitoral, o que envolve a chapa, mas o julgamento do caso segue se arrastando, como nesta semana: Patrícia se deslocou até a capital federal preocupada, por óbvio, e retornou mais tranquila. O julgamento foi adiado mais uma vez.

Em recente conversa de fim de tarde entre dois auxiliares do prefeito Igor Normando, concluiu-se que, em tempo de COP30 e sua grandiosidade, tanto melhor que os problemas maiores da cidade fiquem a cargo do governo do Estado.  

•Fazendo as contas, de tanto se envolver diretamente na administração de Belém, o governador Helder Barbalho deixará o cargo para concorrer ao Senado - se for o caso -, na dúvida entre ter sido governador ou prefeito, ou as duas coisas ao mesmo tempo.

A verdade é que a gestão - meio que - Igor Normando lembra a anterior: criou vários centros de comando que começam a se chocar. É muita ocupação de espaços para pouco espaço.

•O risco é de que a vida política de Igor Normando acabe na “maldição de Antônio Lemos”: quem senta naquela cadeira morre politicamente.

A Comissão de Agricultura do Senado Federal recebe nesta terça-feira, 27, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, para que apresente o panorama atual da situação da gripe aviária no Brasil. 

•Até o momento, o ministério investiga suspeitas de gripe aviária em nove municípios brasileiros. Três no Rio Grande do Sul, três em Santa Catarina e outros casos no Ceará, Tocantins e Pará.

O requerimento de convite ao ministro partiu do presidente da Comissão, senador Zequinha Marinho, do Podemos.

Mais matérias OLAVO DUTRA