Um xadrez tupiniquim: o laço da polarização e o estreito caminho aberto a Daniel Santos

PL lança proposta: apoio total à candidatura em 2026 ao governo do Estado, desde que prefeito de Ananindeua se junte ao bolsonarismo.

Por Olavo Dutra

22/06/2025, 11:20
Um xadrez tupiniquim: o laço da polarização e o estreito caminho aberto a Daniel Santos
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elém e Brasília - Ananindeua respira o ritmo acelerado da periferia metropolitana de Belém. Em seu gabinete, o prefeito Daniel Santos, 38 anos, observa mapas de obras, planilhas de pagamentos e uma agenda lotada, mas, sua mente navega em águas ainda mais turbulentas: o tabuleiro político do Pará para 2026. 

 

Especialistas avaliam que “canto da sereia” prevê tirar prefeito de Ananindeua da sua zona de conforto e perder o foco em meio à polarização/Fotos: Divulgação.

Do lado de fora, ventos fortes sopram do Planalto e de siglas partidárias tentando empurrar o gestor do PSB, hoje o principal nome da oposição ao poderoso clã Barbalho, para uma encruzilhada perigosa que, para os habituados aos relatos encontrados nos evangelhos sinóticos, poderia até lembrar as três tentações de Cristo: a fome, a mais primária das necessidades, a vaidade, que projeta desejos profusos e desmedidos e o poder, escoadouro final de toda fome e vaidade.

O deputado federal Eder Mauro e o Partido Liberal, PL, braço estadual do bolsonarismo, estendem a Daniel uma proposta aparentemente tentadora: apoio total à sua candidatura ao governo, desde que abandone o "PSB alinhado à esquerda" e adote uma legenda “da base bolsonarista”. Em troca, o PL indicaria o vice. "Dr. Daniel é um gestor eficiente... representa uma renovação necessária. Mas, para caminharmos juntos, é fundamental que ele esteja alinhado com os princípios que defendemos", diz a voz anônima de uma liderança do PL, citada em matéria de encomenda para mandar um recado.

A narrativa é sedutora: a "frente ampla", a "frente conservadora e liberal", a "chapa mais competitiva contra os Barbalho em décadas". O “canto da sereia” bolsonarista promete unir o disperso campo oposicionista sob a égide de uma polarização nacional desde 2018 e já se apresenta como desgastada para cerca de 43% dos brasileiros, segundo dados do instituto DataFolha. Mas especialistas e observadores atentos enxergam nessa costura do PL uma armadilha perigosa para Daniel Santos: na verdade, uma tentativa de sequestrar sua trajetória local e transformá-lo em pião de um jogo nacional que não lhe pertence.

A cortina de fumaça

Enquanto isso, em Brasília, outro movimento reconfigura o cenário e expõe as fragilidades de quem aposta tudo na lógica nacional. Helder Barbalho, do MDB, o governador paraense que por anos se projetou como potencial vice na reeleição de Lula em 2026, vê seu castelo de cartas balançar. A governadora pernambucana Raquel Lyra, do PSD, surge como a principal aposta do presidente nacional do partido, Gilberto Kassab, para a vaga. A informação, vazada pelo experiente jornalista Romualdo de Souza, revela a frieza do xadrez presidencial: mesmo após o esforço hercúleo de Helder para trazer a COP30 para Belém - um feito que parecia consolidar sua aliança com o Planalto -, a vaga de vice lhe escorre pelos dedos. Helder mostra-se vulnerável no jogo nacional, o que prova o quão difícil é essa empreitada.

Essa vulnerabilidade, no entanto, não se traduz em fraqueza automática no Estado. Helder continua a ter o mando de jogo. É aqui que reside o risco fatal para Daniel Santos, caso aceite a lógica do PL. "O maior erro que Daniel Santos pode cometer é escolher um lado numa polarização que não é sua, a polarização PL versus PT", alerta um analista e estrategista que circula nos bastidores. "Trazer a polarização nacional para a disputa estadual cria uma cortina de fumaça que favorece Helder, que tem a máquina, a maioria dos prefeitos, a cobertura da imprensa e uma aliança partidária com pelo menos 12 legendas de peso”, sentencia.

Farsa e jogo duplo

Coincidência ou não, a matéria promovendo a aliança com o PL e pintando o deputado federal Éder Mauro como líder das pesquisas - citando levantamento da Doxa - surge como parte de uma coreografia bem orquestrada. "A matéria e a pesquisa formam um combo articulado para simular um clima de pressão que não existe", desmonta o analista Sérgio dos Santos. O objetivo? Forçar Daniel a sair de sua zona de conforto. "Todos sabem que Eder Mauro será candidato a deputado federal para garantir o mandato e o foro privilegiado, por receio de ficar sem mandato e ter o mesmo destino trágico de Wladimir Costa", expõe Santos, referindo-se à prisão do ex-deputado. Eder Mauro, ele próprio um produto da polarização nacional, tem interesse em arrastar Daniel para o seu campo de batalha - um campo onde Helder Barbalho é imbatível.

"Eder Mauro quer que Daniel saia da zona de conforto - de estar em um partido onde tem o controle total - para trocar por um partido de aluguel, onde o cacique ficará refém de um cacique como o próprio Eder Mauro ou Celso Sabino", explica o analista Jota Netto, consultado para a análise estratégica. "A tese de Daniel é simples: ‘Quem quiser apoiá-lo, que vá até ele. Daniel não tem razão alguma para sair do seu poleiro para ocupar um galinheiro onde não seja o galo dominante’." Abandonar o PSB, legenda que conquistou após destronar a família Andrade e onde construiu sua base, seria um salto no escuro, uma subordinação a caciques do bolsonarismo, cujos interesses podem colidir com a sua governabilidade e sua imagem de gestor pragmático.

Polarização que importa

A força de Daniel Santos reside justamente em sua capacidade de transcender a dicotomia nacional. Ele não é Lula. Não é Bolsonaro. É o prefeito de Ananindeua que enfrentou as estruturas locais. Sua luta é estadual, contra décadas de hegemonia Barbalho. "Para Daniel ter chances, ele deve simplesmente esquecer essa polarização e pautar os temas locais, as falhas estruturais do governo Helder e os hiatos de gestão como foco da sua disputa", defende Sérgio dos Santos. "A polarização que interessa a Daniel Santos é anti-Helder versus Helder."

E aqui está o ponto central, o fio que Daniel precisa costurar com maestria: o campo anti-Helder é vasto e plural. "Vai do bolsonarismo agressivo de Eder Mauro até a esquerda radical de Edmilson, passando pelos movimentos populares sem partidos e que nacionalmente tendem a se alinhar a Lula, mas que não querem mais a presidência da dinastia Barbalho." Este eleitorado anti-Barbalho, especialmente o segmento bolsonarista, não é cego nem fiel a Eder Mauro por ideologia, que só alimenta radicais. "Os votos do anti-Helder do bolsonarismo não obedecem ao comando de Eder Mauro. Se obedecessem, ele hoje seria o prefeito de Belém. Esses votos irão para o candidato anti-Helder que tiver mais chances de vencer. E esse candidato é Daniel Santos”, diz Jota Netto.

Caminho da independência

A fragilização nacional de Helder abre uma janela. Mas fechá-la depende de Daniel Santos manter-se fiel a uma estratégia clara: ser o polo aglutinador do anti-Barbalho, sem se deixar contaminar pelos vírus da polarização nacional. Aceitar a tutela do PL significaria alienar parcelas essenciais desse campo diverso, especialmente os descontentes à esquerda e no centro, que veem nele uma alternativa viável, mas rejeitam o bolsonarismo. Significaria entrar no jogo de Helder e Eder Mauro, onde a máquina estadual e a retórica inflamada nacional encontram terreno fértil.

O desafio é hercúleo. Resistir à pressão do PL, que oferece estrutura e votos que talvez não tenha, exige convicção e visão de longo prazo. Exige que Daniel Santos confie no seu capital político construído em Ananindeua, na insatisfação palpável com os Barbalho, e na sua capacidade de articular uma frente verdadeiramente paraense contra a “dinastia”, pautada por problemas reais do estado - infraestrutura precária, desigualdade gritante, gestão questionável dos recursos naturais.

Enquanto os holofotes nacionais se viram para Raquel Lyra e a vice-presidência de Lula, e enquanto o PL tenta arrastar Daniel Santos para seu redemoinho, o prefeito reeleito de Ananindeua precisa manter os pés firmes no chão paraense. Sua vitória, se vier, não será pela bandeira de Bolsonaro ou de Lula. Será pela bandeira do Pará cansado do continuísmo, como aconteceu em 2018, quando Helder era a mudança e o cansaço era com a administração longa e deficitária do PSDB. Será, acima de tudo, por ele ser o candidato que conseguiu costurar o inconformismo disperso em um projeto local, sem se perder nos labirintos de Brasília. O poleiro do PSB é o lugar mais seguro para observar o jogo e cantar sua própria estratégia. O galo dominante precisa cantar sua própria música, não o refrão encomendado por galos de outras freguesias.

O projeto de continuidade do governador Barbalho só cairá quando e se a oposição apresentar uma alternativa que não seja um mero espelho das brigas de Brasília, mas um projeto claro para Belém e para os 144 municípios do Pará. Esse é o único caminho, ainda que estreito, que pode levar Daniel Santos ao Palácio dos Despachos. Todos os outros parecem intransponíveis.

Papo Reto

O “fogo amigo” que tentaram atear no alto comando da Polícia Militar - dando conta de uma suposta operação da PF na casa do coronel Dilson Júnior (foto) -, se extinguio por si só. O coronel nem está no Brasil.

• O pavio foi o seguinte: aproveitar o fato do comparecimento do coronel à PL, no início desde mês, na qualidade de comandante da corporação, é criar um fato novo. Não deu certo.

Dilson Júnior esteve realmente na PF, na condição de comandante da PM, para dar esclarecimentos sobre o episódio envolvendo policiais de Itaituba. E mais não houve.

•A Agência de Regulação e Controle dos Serviços Públicos de Transporte, Artran, que fiscaliza e regula o serviço rodoviário e aquaviário no Estado, tem novo diretor. 

Quem assumiu a direção foi o advogado Luciano Dias, natural de Marabá, que já presidiu a Cosanpa e foi vice-prefeito de Marabá, além de secretário de Saúde e Educação e de Integração Regional, Desenvolvimento Urbano e Metropolitano na cidade.

•Ao lado dele, quem assume a diretoria de Regulação e Planejamento é Denise Pimenta. Wildson Mello assumiu a diretoria de Fiscalização, função que desempenhou na quase mostra Arcon. De volta à casa, pois.

Chamou atenção de quem passava pela rua Municipalidade, terça-feira, 17, um enorme caminhão de mudança em frente à faculdade Estácio. Era uma mudança, mesmo.

•A Estácio Pará, agora, é Estácio Belém e vai trocar de endereço para a unidade da avenida Governador José Malcher, no bairro Nazaré. O nome atual, Estácio Belém Pará, será substituído por Estácio Belém.

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