epois de mais de dois anos de manobras, protelações e cobranças públicas, o Tribunal Eleitoral no Pará marcou para hoje, a partir das 13 horas, o julgamento do senador paraense Beto Faro, do PT, por abuso de poder econômico e compra de votos nas eleições de 2022. A ação expõe em detalhes desconfortáveis o abismo entre a legalidade e a prática política no Brasil.

Protelação rompida
O ciclo de protelação só foi rompido quando o processo foi distribuído este ano ao juiz de carreira do TRE, Marcus Alan de Melo. Ele recebeu o processo no início do ano e o tramitou para julgamento da forma célere, como se espera da Justiça Eleitoral.
Antes disso, nem mesmo as pressões públicas e sucessivos alertas - inclusive com cobrança em plenário, ano passado, do então presidente, desembargador Leonam Cruz, que chegou a cobrar diretamente em uma sessão o então juiz eleitoral Rafael Fecury, à época responsável por ‘segurar’ o processo -, fez com que a coisa andasse.
Conivência silenciosa
O caso é emblemático não só pela gravidade dos fatos - que envolvem o uso de uma rede de funcionários para alavancar votos em troca de tíquetes de alimentação -, mas principalmente pela conivência silenciosa de um sistema que deveria proteger a lisura do processo democrático. A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo e a Representação Especial, reunidas para julgamento conjunto, estão recheadas de evidências e sustentadas por pareceres sólidos da Procuradoria Regional Eleitoral, que defende a cassação do mandato do senador e de seus suplentes.
Apesar disso, até esta semana, o que se viu foi o uso da máquina judiciária para ganhar tempo. Nos bastidores, o caso era tratado como chacota, já que enquanto o julgamento era adiado, Beto Faro avançava em articulações para as futuras eleições e consolidava alianças com vistas a 2026.
O que está em jogo
O que está em jogo nesta quinta-feira não é apenas o futuro de um mandato, mas a credibilidade de uma corte eleitoral que deve satisfações à sociedade que paga seu funcionamento. A morosidade, neste caso, não é inócua: reforça a impunidade e mina a confiança da população em suas instituições.
Hoje, sete juízes ocuparão a bancada do TRE com este peso. Um deles, o novo juiz eleitoral Thiago Sefer, adiantou-se e se declarou suspeito para apreciar o caso, e por isso também não votará na sessão do pleno.
Impacto imediato
Se o julgamento de Beto Faro resultar em cassação, o impacto político será imediato. A cadeira de senador passaria a ser disputada, reacendendo tensões dentro do próprio campo da esquerda paraense - especialmente dentro da Federação Brasil da Esperança (PT/PCdoB/PV), que figura no polo passivo da ação. Haverá, também, por assim dizer, efeitos colaterais.
Mensagem ao eleitor
Caso o TRE absolva o senador, a mensagem passada ao eleitor paraense será devastadora: pode-se fraudar o processo eleitoral com recompensas materiais, desde que se tenha aliados suficientes e tempo para esvaziar as denúncias.
A impunidade institucionalizada reforça um ciclo de abuso de poder que fragiliza o sistema representativo e multiplica a descrença na Justiça Eleitoral. Não é possível aceitar que os mesmos agentes políticos que enfrentam graves acusações sigam negociando alianças para as eleições de 2026, como se nada estivesse acontecendo.
Rito, teatro e omissão
A morosidade da Justiça Eleitoral é incomum, e neste caso não é apenas uma questão técnica; é política. Quando o Judiciário silencia ou hesita, o custo recai sobre a democracia e sobre os cidadãos que esperam equilíbrio entre poder e responsabilidade. O julgamento de Beto Faro é mais do que uma decisão jurídica - é um teste sobre o quanto as instituições estão dispostas a reagir quando a legalidade é atropelada em nome da conveniência eleitoral.
Afinal, como bem ensina a Constituição, todo poder emana do povo - e o povo, ao menos neste caso, está atento.
Papo Reto
• A Ordem dos Advogados do Brasil Pará divulgou a lista oficial dos candidatos inscritos para a vaga do quinto constitucional destinada à advocacia no Tribunal de Justiça.
• Ao todo, 29 advogados e advogadas se inscreveram no processo seletivo, mas apenas 25 candidaturas foram deferidas pela Comissão Eleitoral. Das inscrições deferidas, 11 são de mulheres que preenchem os critérios da paridade de gênero, conforme exigido pelo edital.
•No recorte racial, apenas três candidatos autodeclarados pretos ou pardos tiveram suas inscrições validadas também pela Comissão de Heteroidentificação. Os aprovados nos critérios são Jarbas Vasconcelos (foto), Hugo Mercês e Roberta Pires Veiga.
•As quatro candidaturas indeferidas foram consideradas inaptas por descumprimento das normas do edital, especialmente pela não comprovação dos requisitos exigidos para habilitação. O prazo para eventuais recursos começou a contar ontem.
•Até o mês passado, a cidade de Lisboa tinha 33 mil quartos disponíveis em hotéis e alojamentos. Ou seja, sozinha, a capital portuguesa abrigaria todos os participantes da COP-30.
•De um leitor da coluna: "Belém não tem quartos, não tem aeroporto, não tem restaurantes, não tem transporte...”. Dá-se um jeito, Humberto Ribeiro.
•A Controladoria-Geral da União assumiu todos os processos administrativos instaurados pelo INSS.
•A pergunta que segue sem resposta é: quem, de fato, pagará pela monumental roubalheira de bilhões na conta dos velhinhos?
•Porque o que se diz é que o próprio governo - ou seja, o pagador de impostos - pagará a conta, só não se sabe de onde Lula cortará a montanha de dinheiro para "abafar" a ladroagem.