Áudios supostamente vazados pela "Milícia digital" da Prefeitura de Belém escancara vísceras do Psol

Prefeito de Belém ensaia voo de recuperação política de olho na reeleição, mas campo é minado por aliados muito próximos.

Por Olavo Dutra

02/05/2024 10:20

A teia da aranha: gestão municipal sofre ataques internos e embaralha gabinete do prefeito/Fotos: Divulgação-Áudio e vídeo-Redes Sociais.


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ois áudios supostamente vazados por algum integrante da chamada “Milícia Digital” da Prefeitura de Belém - de efeitos políticos inimagináveis tanto no presente, quanto no futuro - colocam em xeque o prefeito Edmilson Rodrigues e o seu chefe de Gabinete, Aldenor Júnior - ou ambos, dependendo do ponto e vista ou do gosto do freguês. A partir dos áudios, ou o prefeito se divorcia de Aldenor, ou Aldenor chama quem de direito para, digamos assim, “discutir a relação”. A escolha está aberta.

 

“Esse governo afundou!” -, adverte uma proeminente figura do núcleo de poder da prefeitura e da Tendência Socialista, a mesma do prefeito, referindo-se à gestão Edmilson Rodrigues. Do outro lado da linha, o interlocutor ouve a peroração - com cheiro de intriga - quedo e mudo. A advertência sai grave e em um tom irritado, senão autoritário, próprio de quem está habituado a mandar: “Aproveita estes últimos meses pra te organizar na tua vida”. Esse áudio foi claramente editado.  



Conversa de comadres

 

A fala poderia ter sido travada entre duas pessoas comuns se aventurando na avaliação política e administrativa do prefeito Edmilson Rodrigues nesses quase quatro anos de mandato. É recorrente entre oito de cada dez moradores de Belém, principalmente ante a proximidade das eleições, na qual o prefeito vai tentar conquistar a reeleição. Só que não. A advertência, que corre entre grupos de WhatsApp ligados à administração, é atribuída a ninguém mais do que Maria Gracione, a Nice, também conhecida por “Nice Tupinambá”, candidata derrotada nas últimas eleições, que vem a ser mulher do chefe de Gabinete de Edmilson Rodrigues, Aldenor Júnior. O interlocutor, segundo comentários nesses grupos, é Paulo Stark, ambos “considerados” no partido. O segundo áudio, atribuído a Paulo Stark, é mais esclarecedor (veja abaixo; transcrição na íntegra).

 

 


"Não tô nem aí..."

 

"Eu não tô nem aí pra DAS, pra emprego, porque eu sou uma pessoa muito boa no que eu faço. Eu sei fazer política, mas... Mas a decepção, sabe, que eu tô, porque eu conheço a Nice tem uns 12 anos, né? E ela me tratou de uma forma totalmente deplorável. Se te mandar os áudios dela aqui, como ela falava comigo, sempre ameaçando. Ah, tu vai ser exonerado, tu vai ser exonerado. se tu não fizer isso, o governo do Edmilson acabou, afundou. Entendeu? E eu tô recebendo propostas, sabe? Várias propostas. Mas ainda tô avaliando pra onde é que eu vou. Eu não tô nem aí não pra DAS, pra emprego, porque isso é de menos. O mais triste é uma pessoa que Ela usa o fato de ser esposa do Aldenor Júnior, chefe do gabinete, pra humilhar as pessoas, pra cometer assédio moral. E não foi só comigo, não. Foi com várias pessoas, sabe? Muita gente reclama dela. Tá me entendendo? Que trabalha com ela. Então eu não aguentei mais isso. Eu rompi definitivamente com ela. E vou me desfiliar do PSOL. Não tô nem aí. Comuniquei já a Leila, comuniquei a Araceli Lemos, que é a presidente do partido. E eu não tô nem aí, sabe? porque eu sou bom no que eu faço.

 

Tem gente, principalmente gente do MDB vindo atrás de mim, sabe? Eu tô avaliando algumas propostas que eu recebi. Então eu não tô nem aí, não. O mais triste estou decepcionado, porque eu acreditava muito nela. Entendeu? Eu acreditava muito que ela podia ser uma renovação, mas não é, é mais do mesmo, muito pior. Se sem mandato ela já faz isso, imagine uma pessoa dessa com mandato, tá me entendendo?"

 

PSM que afundou

 

Desde o ano passado, Maria Gracione Nice Tupinambá vem sendo acusada no âmbito da Prefeitura de Belém de liderar o “Gabinete do ódio” contra desafetos políticos da gestão municipal, entre eles a atual vereadora Sílvia Letícia. Paulo Stark seria o “chefe da guerrilha”, portanto, supostamente ligado a Nice nessa empreitada. Paulo Stark não tem mais cargo de confiança na prefeitura, mas Nice atua como uma “coordenadora” dos serviços do Pronto Socorro do Guamá, estes sim, que já afundaram, para usar a expressão dela.

 

Entre Fênix e Sísifo

 

Depois de praticamente quatro anos de mandato e uma gestão trôpega, permeada pela pandemia de covid, da qual foi vítima, derrotas financeiras e orçamentárias, perdas pessoais - infelizmente -, e danos coletivos, o prefeito Edmilson Rodrigues ensaia uma reviravolta capaz de lhe garantir a reeleição com base na força da militância, mas o voo da Fênix está sendo minado por baixo, dentro da própria gestão, o que ameaça empurrar o prefeito para a mitológica e dramática situação de Sísifo da mitologia grega, condenado a empurrar eternamente uma pedra ladeira acima, de onde invariavelmente sempre que atingia o topo.

 

Plenos poderes


Não se sabe se por influência do marido, Aldenor Júnior, ou por qualidades e esforço pessoais, Maria Gracione é apontada como detentora de “poderes extraordinários” na gestão municipal, o que implica que sua atuação não se restringe a oferecer bons atendimentos aos pacientes do PSM do Guamá - não é o que dizem os funcionários. Sua atuação dentro da corrente Primavera Socialista, que abriga o prefeito, também é destacada. Então, o que explicaria expressar sua “leitura” sobre a gestão da qual participa, inclusive com o poder do próprio marido, dono da caneta, senão estabelecer uma espécie de “vale-tudo” no partido às vésperas de uma eleição sem o menor desconforto aparente? Bem, “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”, diz o provérbio árabe.

 

Volta por cima?

 

A quem interessar possa, a Coluna Olavo Dutra teve acesso a um vídeo institucional da Prefeitura de Belém, provavelmente caríssimo, de cerca de cinco minutos, que dá bem a medida do esforço do prefeito Edmilson Rodrigues e das agências contratadas para tentar reverter as adversidades colecionadas pela administração no curso do atual mandato. É um chamado à militância, pela qual sempre foi embalado em suas campanhas vitoriosas.


Não parece que Maria Gracione tenha dado importância à peça publicitária, que, ao menos por enquanto, circula apenas nos gabinetes da prefeitura.

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